Leitoras com Swag

Hey garotas, beliebers ou não beliebers. Só estava faltando você aqui! Nesse blog, eu, Isabelle, faço IMAGINE BELIEBERS/ FANFICS. Desde o começo venho avisar que não terá partes hots nas Fics, em nenhuma. Repito, eu faço 'Imagine Belieber' não Imagine belieber Hot. A opinião da autora - Eu, Isabelle - não será mudada. Ficarei grata se vocês conversarem comigo e todas são bem vindas aqui no blog. Deixem o twitter pra eu poder seguir vocês e mais. Aqui a retardatice e a loucura é comum, então não liguem. Entrem e façam a festa.
" O amor não vem de beijos quentes. Nem de amassos apertados. Ele vem das pequenas e carinhosas atitudes."- Deixa Acontecer Naturalmente Facebook.
Lembrem-se disso. Boa leitura :)

Com amor, Isabelle.

terça-feira, 22 de setembro de 2020

One Time 14

Passei a noite no quarto de Jazzy. Vez ou outra ela me pedia para ficar, e naquele dia propositalmente enrolei um pouco conversando com ela, quando tive condições de subir, até que me convidasse a dormir ali. Me recusei a pensar que era por medo de ser uma de nossas últimas noites juntas, eu já estava tão apegada a ela e Jaxon que me doeria muito se tivesse que me separar deles. Contudo, o sentimento de despedida na garganta era quase impossível de engolir. Apertei seu corpinho frágil contra mim como se pudesse obrigar o destino a nos deixar ficar juntas. A família de Justin havia se tornado a minha também, não era só a ele que eu perdia se tudo acabasse no pior dos cenários que se pintavam em minha mente. 

No dia seguinte, levei ela e Jaxon para a escola, acordei mais cedo para deixar tudo meticulosamente arrumado em meu quarto, tomei café da manhã com todos, Pattie ainda estava ali, me lançando breves olhares um pouco preocupados. Procurei evitá-los, ninguém era mais observadora do que Patricia e eu não queria falar sobre aquilo, eu lhe prometera que ficaria, que cuidaria de Justin. Mas não havíamos cogitado a possibilidade dele não me querer mais por perto. Eu também não queria angustiá-la contando que ele estava um pouco perdido dentro de si mesmo. Será que se afastaria da família também? 

Depois que deixei as crianças na escola, ganhando um abraço de cada um que tornou meu humor um pouco melhor, entrei em meu carro para ir a faculdade. A chave já estava na ignição, estava colocando o cinto quando o celular vibrou no contato. Eu li a notificação antes de pegá-lo, uma mensagem de texto:

"Precisamos conversar". 

O clima naquele dia estava mais gelado do que nos anteriores. Os flocos de neve rodopiavam pelo ar como um lembrete congelante de que o pior ainda estava por vir. Naquele momento, eu não conseguia imaginar frio mais terrível do que tomou conta do meu coração. Sem ao menos um "bom dia", "Oi, Faith", ou qualquer cumprimento idiota, Justin me enviara aquelas temíveis palavras. Não se tratava só da reação imediata de um ser humano ao ser chamado para uma conversa sem anúncio prévio do motivo, era toda a junção dos fatos que já estavam em minha cabeça que me paralisara daquele jeito. 

Parecia que eu estava a beira de um precipício, sentindo uma presença opressora nas minhas costas prestes a me empurrar, o medo corria impiedoso por meu sangue, meu estômago se revirava com violência e o coração parecera imediatamente silenciado. Procurei alternativas que me salvassem na minha mente, mas o pânico espantara todas as palavras. 

Peguei o celular, percebendo que eu tremia. Expirei e digitei sem pensar:

"Quando e que horas?"

Se eu estivesse em condições de pensar, veria o quanto parecera duas pessoas marcando uma briga, poderia até rir, mas não tinha graça. Não quando realmente aconteceria uma briga que me nocautearia. Tive esperanças de que ele demorasse a responder. De repente não queria mais conversar com ele, toda a atenção que desejara havia passado. Se ele quisesse podia me ignorar por mais alguns dias, seria melhor do que ter aquela conversa. 

"Depois da sua aula, passo para te buscar. Pode ser?"

Além da minha óbvia covardia, havia algum motivo lógico para negar a oferta, contudo não consegui raciocinar rápido. 

"Ok."

Expirei, esmorecendo no banco do carro. Precisei me lembrar de como respirava, tinha a impressão de que estava sem ar. De repente eu não via mais nada a minha frente, tinha certeza de que não tinha condições de ir para a faculdade, mas não sabia mais aonde ir, o que fazer. Meu cérebro duramente atacado se agarrara na programação do dia, e eu poderia contar apenas com isso vindo dele.

Inspirei e expirei de novo, forçando oxigênio no meu sistema a fim de me acalmar. Talvez minha reação estivesse sendo exagerada. Qualquer que fosse o resultado daquela conversa. Me encolhi. Tudo bem, talvez não tão exagerada assim. Mas eu não podia me deixar abater daquele jeito, tinha deveres a cumprir. Aquele era o último dia de revisão para as provas que começariam impiedosamente no dia seguinte. O mundo continuaria girando, não pararia para me esperar. 

Agindo mecanicamente, girei a chave na ignição e arrastei com garras todo aquele nervosismo e a notícia do que eu faria mais tarde para o canto do meu cérebro. Eu não podia lidar com aquilo naquele momento. Tinha que sobreviver ao dia. Eu sabia bem como sobreviver a um dia. Bloqueei os pensamentos que viriam com essa nova linha. 

Num piscar de olhos eu estava na faculdade, nem atrasada ou adiantada, na hora. Entrei na sala e me dirigi para minha carteira sem ver ninguém, a atenção voltada para a frente, ansiosa para que o professor chegasse. Eu precisava me concentrar em atividades iminentes, não ajudaria em nada ficar parada apenas com a missão de conter meus temores. 

— Faith — Lucas me chamou, encostando de leve em meu ombro — Está tudo bem? — ele pareceu quase assustado ao olhar meus olhos. 

Fiz que sim com a cabeça, imaginando qual seria minha expressão, tentei senti-la, mas para mim parecia apenas neutra. 

— Tem certeza? Aconteceu alguma coisa? — Ele ainda estava preocupado. 

Suspirei, forçando minhas barreiras para não deixar escapar o que eu evitava pensar. 

— Sim, Lucas, tudo tranquilo. E você? — Para mim, minha voz estava ligeiramente distante. 

Ele me avaliou mais um pouco, então resolveu respeitar meu espaço, no sentido figurado, já que logo me empurrou um pouco para o lado a fim de dividir a cadeira comigo. 

— Bem, por enquanto tudo permanece o mesmo. Mandei uma mensagem para Ava ontem a noite pedindo perdão de novo, mas ela não me respondeu. Como você pode ver ela e Ethan ainda não chegaram, mas os amigos dele estão aqui — ele olhou discretamente por cima do ombro — e ainda não me olharam feio. Claro que pode ser apenas um disfarce, eles estão esperando o mandante para me atacar... 

Dei um sorrisinho, o movimento pareceu completamente desconectado do meu corpo. 

— Não seja tão negativo. Vai ficar tudo bem. Qualquer coisa você pode se esconder atrás de mim. 

Cogitei a ideia de apanhar e ir parar no hospital para escapar da conversa que teria mais tarde, e imediatamente me repreendi por isso. 

Lucas enrijeceu ao meu lado de repente, e eu não teria notado se seu corpo não estivesse colado ao meu, lado a lado. Adivinhei qual era sua motivação, e olhei para a porta a tempo de ver Ava e Ethan entrando na sala. Com o braço descansando nos ombros de Ava, nosso colega não parecia irritado. Ava, por outro lado, tinha uma ruguinha discreta de estresse entre as sobrancelhas, e evitou diligentemente olhar em nossa direção, marchando para seu lugar. Ethan deu um selinho rápido nela antes de se direcionar ao seu lugar de sempre, ao fundo, e resignada, ela se sentou na fileira do meio, estrategicamente longe de nós três. 

Lucas só respirou quando Ethan se sentou, e então cochichou para mim. 

— O que você acha? Ele nem nos cumprimentou também, isso quer dizer alguma coisa? Ou só estava distraído? Distraído planejando quebrar meu queixo. 

Se fosse outro dia eu poderia rir da sua histeria, mas apenas empurrei seu ombro com o meu de leve. 

— Acho que ele não sabe de nada, Ethan não é uma pessoa de se conter, se soubesse ele viria direto te quebrar. Ou conversar com você — dei de ombros — Está tudo bem, Lucas. Não acho que ela vá contar a ele, por mais brava que possa estar, ela não ia querer que você ficasse hospitalizado. 

Lucas me lançou um olhar estranho. 

— Hmm... Se você acha. Talvez eu precise ficar perto de você só por precaução durante o dia todo, se importa? 

Estiquei o canto da boca. 

— Nem um pouco. 

Assim que o professor entrou, ele se sentou na carteira ao lado da minha, tive a vaga impressão de que me supervisionava, embora não soubesse a lógica disso. Fiz o máximo que pude para prestar atenção na revisão, tomando notas em meu notbook. Com o tempo percebi que eu estava ansiosa por cada palavra, quase digitando tudo o que saía da boca do professor. Eu queria socar o máximo de matéria possível em meu cérebro, a ponto de não sobrar espaço para pensar em mais nada. E foi o que eu fiz, poderia permanecer horas a fio nas aulas, secretamente desejava que o período pudesse se estender por dias, meses, por todo o restante do ano. Eu não me importaria em perder as festas de fim de ano, aquela podia ser minha festa, de evitar o inevitável. 

Quase gemi quando chegou a hora do intervalo. Almoço. Lucas já estava ao meu lado, quase me atirando fora da cadeira para sairmos primeiro que o casal do ano. Eu o acompanhei sem ânimo. Seguimos para o restaurante do campus em silêncio, eu me concentrava muito nos movimentos necessários para me manter andando, reparando no fundo que o ar estava ainda mais frio. Talvez eu congelasse de dentro para fora. 

— Hm, não está com fome? — Lucas chamou minha atenção quando fui pagar minha comida. 

Eu nem havia percebido o que pegara, hm, uma garrafa de água e um chiclete. 

— Não muito. 

Nos sentamos numa mesa do canto por escolha de Lucas, ele estava o tempo todo atento a nossa volta, esperando um ataque repentino. Não parecia a pessoa ideal para me distrair, já que ele mesmo estava distraído. Mas antes que eu pudesse fazer alguma coisa sobre isso, meu celular despertou para uma chamada. Não houve tempo para temores, o visor já denunciava que era Hanna. Abençoada seja Hanna, ela é uma tagarela nata. Não havia motivos para ser diferente naquele dia. 

Ela estava muito empolgada sobre a última visita que recebera na galeria no dia anterior. Rafael finalmente dera as caras de novo.

— Ele me passou contatos importantes, e conseguiu me encaixar numa exposição de artes super badalada que vai ter em Minneapolis. Vai ser o máximo! Você devia vir... — convidou, já sem esperanças. 

— Eu adoraria. 

 É complicado, eu sei. Bem, então como retribuição eu fiz uma coisa.... — agora ela estava hesitante. 

Fiquei desconfiada de imediato, mais alerta. 

— O que?

— Eu meio que.... hm, eu meio que acabei soltando do jantar de ação de graças aí dessa semana... Eu disse que ele podia vir com a gente... Que eu só confirmaria com você a possibilidade. 

Hanna sabia que eu não conseguiria negar uma coisa dessas assim. Ele sabia que só dependia da minha resposta, ficaria muito feio recusar. Na verdade, eu não me importava muito que ele viesse. O problema era que a casa não era minha e o proprietário já estaria um pouco estressado pela presença de Wren, não que ele gostasse menos de Rafael, mas mesmo assim. E é claro, havia a questão suprema: eu nem sabia se esse jantar permaneceria em pé depois de nos encontrarmos hoje. 

— Hanna... já ouviu falar daquela história que convidado não convida? 

Ela deu uma risadinha culpada.

— Me perdoa. São hábitos ruins, você sempre me deixou muito a vontade aqui em Boston, como se eu fosse de casa, então... 

— O problema é que essa casa não é minha. 

Houve um breve momento de silêncio. 

— Ah, hm, eu deveria ter me lembrado disso. Me desculpa mesmo, eu vou avisar ele que... 

— Não, Han, tudo bem. Depois a gente conversa certinho sobre isso — depois que eu for chutada e cancelar o jantar com todo mundo. Nós ainda poderíamos fazê-lo em Boston. E eu sabia que meu humor estaria quase tão bom quanto na ação de graças do ano retrasado. 

Aliás, quanta ironia. No dia seguinte completaria dois anos que ele decidira morrer para mim. Poderia ser um padrão se repetindo. Dessa vez menos pior. Eu preferia com absoluta certeza que ele permanecesse vivo, ainda que longe de mim. Podia suportar isso. Só não conviveria com sua ausência de existir. Meu mundo só fazia sentido se ele continuasse vivo. A linha de pensamentos acabou arrombando minha caixa tão bem guardada no fundo da mente, soltando meus pesadelos. Se eu não estivesse junto dele, como poderia saber que ainda estava bem? Como teria certeza de que ele mudaria para uma profissão mais saudável, ao menos? Que estaria seguro, longe de inimigos? 

Senti meu rosto perder a cor com as possibilidades, atraindo o olhar assustado de Lucas, que movimentou os lábios quase em silêncio para perguntar se estava tudo bem. Assenti rapidamente e engoli em seco, como se a saliva pudesse empurrar os pensamentos descontrolados novamente na caixinha. Levei alguns segundos para isso, e Hanna teve que repetir a pergunta. 

— Faith? Está tudo bem? Sua voz parece... estranha.

— Sim — menti com firmeza — Me conte sobre essa exposição de artes. 

Pausa.

— Você está me escondendo alguma coisa. Não quer me falar? Precisa de ajuda? — Ela estava a cada segundo mais apreensiva. 

— Hanna, estou em segurança. Está tudo bem. — A primeira parte era verdade, pelo menos. 

Escutei seu suspiro. 

 Podemos conversar sobre isso depois, então? Promete? 

Eu suspirei dessa vez.

— Tudo bem — cedi. Depois de conversar com ele eu precisaria mesmo desabafar. 

— Então esse é um daqueles momentos que você precisa que eu te encha de assuntos triviais? 

Forcei uma risadinha. 

— Sim. 

— Tagarelice a pronta entrega para você então..... — e se desdobrou em seus assuntos intermináveis pelo resto do intervalo inteiro. Havia fofoca fresca no bairro sobre uma nova residente que parecia curiosamente reservada. Estavam tentando decidir se ela estava envolvida com atividades ilícitas ou se apenas era antissocial. Hanna apostava na primeira opção, já que ela parecia nova demais para não curtir a vida, "mais ou menos da nossa idade". 

Recebi descrições minuciosas de todos os boatos e as características da mulher rica e linda que inquietava os vizinhos. Eu me sentia um pouco culpada por deixar Lucas isolado momentaneamente, mas ele não parecia mesmo notar, esquadrilhando os espaços. Talvez ele precisasse tanto quanto eu de uma distração, e eu estava sendo uma péssima amiga naquele momento. Mas não encontrei coragem para desligar o celular e me forçar a conversar com ele, eu não estava em condições de puxar assuntos como ele parecia precisar que eu fizesse, e se ficássemos naquele silêncio doloroso não ajudaria ninguém. 

Então apenas me despedi de minha amiga quando já era hora de voltarmos à sala. 

— Está tudo certo? Você me assustou aquela hora. 

— Ah sim, está sim, eu... Me desculpa por ficar com Hanna o tempo todo do intervalo em ligação. 

 Ele estreitou os olhos para minha resposta vaga a sua pergunta. 

— Não se preocupe por isso — então respirou fundo — Vamos poder estudar hoje? 

— Bem... Acho que não. Qualquer coisa te aviso — tecnicamente, eu não sabia nem onde dormiria naquela noite. Não que achava que Justin fosse capaz de me expulsar da casa de sua mãe, só que não seria melhor partir imediatamente?

E partir para onde? 

Lucas se sentou na minha cadeira comigo e ficou rígido de novo quando Ava e Ethan voltaram do intervalo. Nossa amiga parecia mais inquieta. No fundo eu sabia que deveria falar com ela, não era comigo que estava chateada. Mas Lucas precisava do apoio e... eu não conseguiria me esforçar a ser normal para mais uma pessoa daquele jeito. 

Fiquei grata quando a professora entrou na sala, fazendo uma piadinha sobre sentir nossos nervos com a aproximação das provas finais. Eu ficaria feliz se esse fosse meu único problema. 

Como era o último período do dia, claro que a hora passou muito mais rápido do que eu queria, e eu senti a ansiedade transbordando pelos meus poros, rasgando todas as camadas da minha pele antes de vazar do meu corpo, meu coração mal tinha forças para bater. E quando o professor do último tempo deu a aula por encerrada, não consegui conter o gemido dessa vez. Eu queria protelar, arrumar uma desculpa para ficar na sala, mas Lucas já estava ao meu lado, ele não brincara ao dizer que ficaria ao meu lado o dia todo. 

— Vamos, Faith? — Seu nervosismo era tão evidente que eu não podia ignorar. 

Contra minha vontade, me levantei da cadeira. Ele me ajudou a recolher minhas coisas, pensando estar sendo gentil, enquanto na verdade eu tentava prolongar o máximo a tarefa. Tentei conter a irritação, a culpa não era dele. 

— E então, quais são os seus planos para hoje? — Perguntou com a voz descontraída, mas toda a atenção centrada em mim, como se a conversa fosse muito relevante. 

— Ah... Eu acho que vou ficar com o Justin um pouco — Será que ele podia ouvir a falha na minha voz quando eu falei o nome de Justin?

Talvez sim, a preocupação voltou ao seu rosto, franzindo suas sobrancelhas grossas. Ou talvez ele só se lembrara da pequena desavença no dia anterior. 

— Entendo. Bom, você sabe que se precisar de mim é só chamar, certo? Sério, a qualquer momento — ele agitou seus cachos.

Abri um sorrisinho e dessa vez era genuíno. 

— Claro, obrigada, Lucas. Você também.

Ele piscou pra mim e já estávamos na entrada da faculdade. A temperatura caiu ainda mais. 

— Estou contando com isso — ele beijou o topo da minha cabeça — Tchau, Faith, até amanhã. 

Pela visão periférica eu podia ver Ethan e Ava se aproximando, provavelmente Lucas correria o mais depressa possível para o carro e derraparia para longe da faculdade. Acenei rápido antes que ele se virasse e apressasse o passo para a saída. Respirei fundo e o acompanhei com os olhos, tanto para garantir seu bem estar quanto para procurar a minha ruína. 

Ninguém correu atrás do Lucas, e Ethan não parecia motivado a isso quando passou com Ava devagar perto de mim. Não me virei para olhar pra eles, ainda investigando pelas pessoas e carros ali na frente. Eu me lembrava agora o motivo de um impedimento para Justin vir me buscar, eu estava de carro. Bem, não era como se eu nunca tivesse deixado um veículo em frente a uma faculdade para darmos um passeio. Lembrei-me de quando estávamos nos conhecendo e ele apareceu com aquela moto preta reluzente, tão sedutor e convincente. 

Engoli em seco com a lembrança. Tanto já havia mudado até ali. 

Olhei em volta, percebendo mais uma vez no quanto eu mudara por ele, quanto dispusera da minha vida. Eu já estava no Canadá há dezoito meses. Dezoito meses que acatei mais uma mudança brusca por ele. Por nós.

Não parecia justo para mim. Ele simplesmente jogaria todo esse tempo no lixo como se não fosse nada? Já nos preparávamos para a segunda festa de ação de graças, de natal e ano novo juntos. Eu dei meu sangue para que o clima fosse inteiramente familiar, missão esta complicada porque Bryan meio que o odiava ainda. Mas Eleanor quase já não criticava Patricia. Jazmyn e Jaxon estavam mais apegados a mim do que nunca. Todos nós éramos uma família. Claro que não perfeita, a propósito, existe alguma família perfeita? Sei que ainda tínhamos muito a resolver, e só podíamos fazer aquilo juntos.

O fluxo de pessoas diminuiu até que não restava quase ninguém ali enquanto eu repassava os últimos meses da minha vida na cabeça — meio como se eu estivesse prestes a morrer mesmo. Imaginei se ele ia querer me dar um bolo igual me deu no passado por duas semanas. Talvez fosse mesmo melhor do que a conversa. Eu devia pegar o carro e ir para a sua casa? O suspense estava me matando. Ou podia dirigir diretamente para o restaurante de Patricia e me esconder atrás dela como uma boa covarde.

Chutei a neve acumulada aos meus pés no jardim da faculdade. Minhas meias já estavam úmidas aquela altura e os pés congelados de ficar dando voltas infinitas no espaço descoberto. No momento, essa parte não me importava. Não. Justin não podia estar pensando em terminar comigo agora. Mas o que mais justificaria seu comportamento estranho nas últimas semanas? 

Fui contando nos dedos minhas reflexões. Ele mal falava comigo, mal tinha tempo de me ver, e quando estávamos juntos, parecia distante. Um hora eu o tinha e outra não. Está certo de que minhas aulas serem de período integral não ajudava muito, e diversas vezes ele tinha que trabalhar à noite e viajar, mas nada justificava sua ausência quando estava presente. Provavelmente havia se cansado, finalmente. 

É isso. Se cansou. Perdi a batalha. Estava bom demais para ser verdade mesmo. Desde o começo eu soube que ele não era uma pessoa cômoda com as tradições sociais. Almoços aos domingos com a família reunida, preparar festas de aniversários para crianças, frequentar a igreja às vezes (o mais inacreditável) e estar preso a uma namorada não era do seu feitio. Enganosamente, no início, pensei que ele estava se adequando ao estilo familiar, e até mesmo gostando.

. Ao menos não terminou tudo por uma mensagem no celular, isso lhe dava pontos no caráter. Faria aquilo pessoalmente, como um homem. Não que isso fosse mudar alguma coisa quando as palavras enfim quebrassem meu coração em mil pedacinhos. Fiquei com raiva mais uma vez pela época escolhida para fazer aquilo. Semana de provas e o aniversário de sua suposta morte queria dizer "me dê muita atenção e carinho", não "quebre meu coração mais uma vez". .

O que eu faria? Me mudaria para um apartamento sozinha? Trancaria a faculdade e voltaria para os meus pais com o rabo entre as pernas? Eu não suportaria continuar nessas redondezas sem ele. Se eu voltasse aos Estados Unidos, contudo, sua família paterna ficaria feliz de me receber de braços abertos.

Minha respiração se acelerava cada vez mais, combatendo a iminente falta de ar. Talvez eu fosse desmaiar dali a pouco.

“Cheguei”, li em meu celular.

Farpas afiadas rasgaram minhas tripas. Choraminguei olhando para o céu cinza. O clima combinava com a ocasião. Apesar das minhas roupas, o frio parecia atravessar o tecido e gelar minha alma.

Tudo bem. É melhor enfrentar isso de uma vez, Faith. Esfreguei as mãos cobertas de luvas. Você deve se valorizar, mulher, não é o fim do mundo. Bati as mãos em minhas bochechas. Soltei o ar e caminhei para a saída. O carro estava parado bem em frente ao portão, à minha espera. Levantei a cabeça e entrei.

— Ei — saudou-me com um fantasma de sorriso.

Ah, a quem eu tentava enganar?! Eu não estava pronta para isso! Deus, eu o amo demais. O modo como deixava seu cabelo curto agora, levemente arrepiado na frente de modo natural, o rosto sempre depilado, os olhos notoriamente brilhantes na luz, sua elegância incontestável nos trajes de inverno. Cogitei implorar que não terminasse comigo, mas seria humilhante demais.

— Oi — respondi um pouco estrangulada.

Isso fez com que realmente me olhasse, provavelmente não queria que eu sujasse seu carro com vômito ou morte.

— Está tudo bem?

Preferi não usar a voz dessa vez, assenti. E ele deixou pra lá. Esse era outro péssimo sinal, Justin sabia quando eu mentia, o que quer dizer que não se importou. Ligou o rádio em sua estação de rock preferida, e quase ri de nervoso. Eu sempre soube que o mundo conspirava contra mim, mas já era demais tocar I Don’t Wanna Miss a Thing – Aerosmith num momento desses. “Eu não quero sentir falta de um sorriso, não quero sentir falta de um beijo, eu apenas quero estar com você”. Seu cheiro estava em toda a parte durante todo o trajeto, e como uma viciada eu o respirei em grandes lufadas de ar, temendo ter pouco tempo para senti-lo.

O carro foi estacionado em frente à sua casa. Que gentil, ainda me daria a chance de ver seu refúgio uma última vez, não me levaria a um lugar público para me despachar imediatamente como poderia ter feito. 

— Você pode... subir comigo um pouco?

Eu já estava ali, não estava? O acompanhei casa a dentro ligeiramente aérea, cada passo parecia meu fim, imaginando a forma inusitada que preparara de anunciar o término. Talvez tivesse comprado uma passagem só de ida para os Estados Unidos, por que não?

Paramos em frente a um quarto de hóspedes no segundo andar e eu já estava sem oxigênio no corpo.

— Eu preciso da... sua opinião para uma coisa. Promete pensar com calma? Essa pode ser a última promessa que me faz — ele me olhou com seriedade nos olhos de mel, no fundo, parecia tão perturbado quanto eu. Iludi-me pensando que aquilo seria tão difícil para ele quanto para mim. Se assim fosse, eu poderia demovê-lo do erro.

Retesei-me. "Última promessa?" Sim. Era aquilo. Mas ter meus medos confirmados não me ajudaram em nada. Pisquei para tentar manter meus olhos secos. Passaram-se o que se pareceram minutos até que eu me obrigasse a assentir. Para isso precisei reunir todas as minhas forças, deixando minhas pernas bambas. O calor emanava do seu corpo perto do meu, enganosamente acolhedor. Contudo, ele não me tocara em momento nenhum desde que nos vimos.

Com minha confirmação, Justin abriu a porta e acendeu a luz. O segui cambaleante para dentro, o cômodo estava praticamente vazio, apenas um lençol cobria algum objeto grande no fundo. Justin seguiu exatamente até ele, e pareceu pensar muitas vezes antes de puxá-lo. Eu estava nervosa o bastante para tentar criar hipóteses que justificassem aquilo, só conseguia pensar em todos os motivos para lhe atirar para ficarmos juntos. Nós nascemos para isso. Pertencíamos um ao outro. Ele não podia sentir?

Ou... eu podia sobreviver solteira. Havia nascido solteira, podia morrer sem nunca mais tocar sua pele macia, beijar seus lábios de coração, acariciar seus cabelos quase ondulados e encarar seus olhos de pestanas grandes e escuras. Podia não ouvir mais o som de sua risada infantil e as promessas de que me amava. Podia deixar para trás todos os planos que fizemos para o futuro. 

Sim, eu podia. 

Mas ali, contornando a forma de suas costas largas com meus olhos, tive certeza de que só o faria se já estivesse junto de Deus.

Quis cobrir o rosto quando ele saiu da frente para que eu me aproximasse. Em contrapartida, dei dois passos em direção ao objeto, contra minha vontade — sabendo que eu estava prestes em me atirar em seus braços e chorar —, e automaticamente reconheci um cavalete. Esqueci-me um pouco do meu dilema quando visualizei a pintura que este sustentava, nada melhor para distrair um amante de arte do que a própria arte. Era isso que ele queria? Me amaciar antes do matadouro?

— Hm, de quem é essa pintura? — meu primeiro instinto foi procurar uma assinatura, localizada no canto inferior esquerdo — Você... você quem fez? — surpreendi-me. Claro, ele sempre me surpreendia. Até suas surpresas me fariam falta.

— Sim — a resposta estava carregada, mas não me virei para olhar. Eu não poderia olhar seu rosto a essa altura e me certificar de que não haveria lágrimas escorrendo por minhas bochechas.

Acompanhei os detalhes muito bem feitos da técnica de pintura a óleo sobre tela para identificar o desenho. A cama colossal de lençol azul abrigava um corpo adormecido. Com os cabelos ondulados jogados para trás, era possível visualizar os traços do rosto relaxado.

— Sou... eu? — balbuciei.

— Sim.

Fitei-o impressionada. Perfeccionista como só ele sabia ser, sua pintura parecia um retrato estupendo.

— Justin... desde quando você pinta? Quanto tempo gastou pra fazer isso?

Esse seria o término mais bonito da história. Ele de fato se esforçara para me deixar o mais confortável possível. Se perdera seu tempo precioso aprimorando suas habilidades com um pincel, ainda devia me considerar com carinho. Hanna me contara que várias de suas amigas mantinham uma amizade com os ex namorados, mesmo que ela não entendesse como isso era possível. Talvez eu pudesse me conformar em ser sua amiga.

Toquei na tela receosa de que ainda estivesse molhada. A ponta do meu dedo indicador permanecia seca, então delineei as formas transpostas com tanto cuidado ali, visualizando um Justin sentado em um banco com a postura impecável — como sempre —, concentrado em aplicar um pouco mais de força ali e delicadeza aqui.

Eu nunca poderia ser apenas amiga desse homem.

— Não chega nem perto do quanto pretendo dedicar a você — a intensidade em sua voz aveludada me atingiu como um chicote. 

— Hein? — voltei-me a ele, sobressaltada.

Justin passou a língua sobre os lábios, e agora eu via o quanto ele estava nervoso, a respiração tão pesada quanto a minha. Confirmei o veredicto assim que tomou minhas mãos — já livre de luvas — nas suas, geladas o bastante para que eu me preocupasse em aquecê-las.

— Eu não sou digno de você, Faith. Não sou digno de seus olhares bondosos e cheios de carinho. Não sou digno dos seus beijos tão entregues. Não sou digno dos seus pensamentos mais puros. Não sou digno de te ter em meus braços como minha. Eu sei disso. Tentei pensar em uma forma de te libertar de mim. Tentei me distanciar de você para te fazer entender que a vida oferece muito mais do que um ser quebrado e falho como eu, porque me dói o que significa para você estar comigo. O perigo constante — a voz dele falhou e seus olhos estavam úmidos de repente.

— Mas não consigo mais. Eu não consigo estar sem você. Estou tão perdido, mas você é a minha única certeza. E sou egoísta o bastante para querer que todo o meu tempo seja seu, Faith. Quero estar atado a você de todas as formas possíveis. Quero que nós sejamos um só, de forma que seus traços sejam visíveis em mim, que eu possa refletir seu coração. Quero respirar o seu ar. Quero que seu rosto seja o primeiro e o último que vejo no dia. Quero firmar sob o Céu e a terra que você me tem por inteiro, que eu te pertenço. Eu quero... — a essa altura, eu parecia sentir o bombear frenético do seu coração na ponta dos dedos — te dar meu sobrenome, e te proteger com tudo o que eu tenho e sou. Você tem todo o direito de não querer e fugir de mim sem pensar duas vezes. A escolha é sua. — Com os olhos cravados em mim, Justin se abaixou, entendi então que ele se ajoelhava e perplexa o vi estender uma caixinha de veludo aberta para mim — Por isso, eu te pergunto, Faith: Você aceita se casar comigo?


sábado, 5 de setembro de 2020

One Time 13

 Batuquei a caneta na mesa num ritmo constante, tendo dificuldades para conseguir me concentrar nos estudos. Se continuasse daquele jeito, eu provavelmente zeraria as provas. Bufei, frustrada comigo mesma, mas não podia afastar dos meus pensamentos aquela carta e a resposta do meu excelentíssimo namorado a ela. 

"Senhorita Evans

Com imensa honra e nossos mais sinceros cumprimentos, por meio desta, queremos lhe convidar, como acompanhante de nosso funcionário Justin Bieber, a comparecer ao baile exclusivo anual em comemoração à fundação da Cavanagh no dia 23 de novembro de 2018 às 22 horas. Dez minutos antes do horário e dia em questão, um carro se direcionará à sua residência para levá-la ao local designado. 

Na certeza de que teremos finalmente sua ilustre presença entre nós, nos despedimos, por ora. 

Companhia Cavanagh."

Se era um evento anual, não entendi o motivo de não terem me convidado no ano passado. Não, na verdade, por que estavam me convidando esse ano. O fato me deixou nervosa, lembrava-me muito bem do baile em que conheci George Bieber e a vulnerabilidade que o evento trouxera a Justin e eu. Seria como entrar na cova dos leões, e, esse baile em questão era pior, uma comemoração da "empresa" com todos os seus funcionários extremamente competentes em matar pessoas. Também não podia esquecer o fato de que estávamos devendo em nossa lealdade, maquinando nas costas deles. Eu tinha medo de sentir minha consciência pressionada demais a ponto de gritar no meio do baile "SIM ESTAMOS TENTANDO NOS LIVRAR DE VOCÊS".

E então eu mandei uma mensagem alerta para Justin, imaginando que se eu ligasse não me atenderia "JUSTIN: ALERTA CAVANAGH! ME LIGUE ASSIM QUE POSSÍVEL. U.R.G.E.N.T.E". Se eles me esperavam na sexta feira, provavelmente eu não corria riscos agora, não precisava ligar insistentemente até que ele atendesse. 

Curiosamente, Justin me retornou quase na mesma hora, num tom alarmado. Eu contara sobre a carta, lendo-a calmamente para ele. Expliquei que Diane pegara no nosso correio, eles não estavam a vista (pelo menos onde eu podia ver) e sim, Caitlin estava conosco. Justin grunhiu de irritação e murmurou entredentes:

— Você ir de minha acompanhante? — Distorceu as palavras. 

Eu sabia que era idiota da minha parte, mas me chateei com a frase, encolhendo-me. Ele provavelmente os criticava pelo convite sem noção, não questionava minha qualidade como sua "acompanhante" em geral. Mas não contive minha língua rápido o bastante:

— Bom, eles parecem pensar que sou digna de aparecer com você — murmurei a meia voz. 

— Digna de aparecer comigo? Faith, eles estão loucos. Eu já avisei para manterem distância de você. Agora acho que devo especificar para "nenhum contato" — bufou com sarcasmo. 

A paranoia em minha mente se agitou "viu, ele não confirmou que somos um belo par juntos, mas que apenas seria arriscado para o evento em si que estivéssemos lá". Balancei a cabeça, eu já estava passando do absurdo da carência. 

"Sim, e de quem é a culpa?"

Conversar comigo mesma daquele jeito não podia ser bom sinal. 

E se teve um baile anual no ano anterior, quem havia sido sua acompanhante então?!

— Assim que eu chegar tomarei medidas sobre isso. Preciso pensar um pouco. 

— Claro — respondi vagamente. 

— No mais, está tudo bem? — Perguntou, atento. 

— Ah, sim, minhas babás estão fazendo um ótimo trabalho — ironizei. 

Ele quase riu. 

— Ótimo.

— E por aí, está tudo bem? Quando você volta? 

— Tudo certo. Logo. Domingo ou segunda. Mande um abraço a todos, está bem? 

A voz dele, eu odiava a voz dele e o quanto ela mexia comigo, parecia aumentar minha saudade e a vontade de vê-lo, parecia caçoar de sua ausência na minha cara. 

— Ah, sim, eu mandarei, eu... — então houve um barulho do outro lado da linha e Justin xingou. 

— Nos falamos depois, Faith — e desligou. 

— ... amo você — suspirei. 

Sem novas atualizações desde então, eu me encontrava naquele conhecido poço de frustrações e paranoias. Não podia me concentrar em mais nada, nem nas brincadeiras com as crianças, nem nas conversas com Diane e Bruce, ou na culinária com Pattie. Meu sexto sentido me avisava que nosso relacionamento estava sendo conduzido a uma bifurcação, ou melhor, Justin nos conduzia. Não sabia dizer para o quê ou por quê. E não aguentava mais pensar naquilo, quase valia a pena chegar logo para acabar com o suspense. Tinha alguma coisa errada, eu sentia nos meus ossos, e as evidências estavam ao meu favor.

Estremeci.

Não, não valeria a pena. Eu não queria descobrir o que havia no fundo daquela trilha. Saltei em prontidão quando a campainha tocou, aliviada em poder fazer alguma coisa. Embora estivesse em meu quarto, cheguei antes que qualquer um na porta. Eu não conseguia me lembrar onde estavam todos. 

— Ei — Lucas deu seu sorriso simpático para mim, os olhos nebulosos. 

— Faith! — Ava acenou. 

Ambos se agarravam a livros e mais bolsas. Eu transpareci minha surpresa sem precisar abrir a boca. 

— Você esqueceu do nosso grupo de estudos para as provas? — Ava me repreendeu de testa franzida. 

Tentei disfarçar a culpa, acenando para que entrassem. 

— Não! Claro que não, entrem. 

Os dois trocaram um olhar, eu não enganara ninguém, porém, não comentaram sobre. Nos instalamos na sala de estar, espalhando os livros e notebooks. Eu me deitei de bruços no tapete, balançando as pernas no ar enquanto Lucas nos atirava perguntas sobre... Hm, qual matéria era mesmo?

— Perfeito, Faith! Está tão horrível que não vai precisar se esforçar tanto para tirar um zero — a ironia salpicou as pontas do seu sorriso. 

Atirei uma caneta nele, que se esquivou habilmente. Ela rodou para baixo da poltrona e eu gemi de desânimo. 

— Sério, você está vencendo Ava nos primeiros dias de sua história melosa com Ethan — a acidez no tom de sua voz ultrapassava a critica a um romance grudento, eu sabia. 

Ava lhe mostrou a língua. 

— Tem alguma coisa te incomodando? — Ela empurrou meu ombro com o seu, estando bem ao meu lado na mesma postura. 

Expirei ruidosamente. Sinceramente, até eu estava me cansando da minha pessoa. Não queria pensar no mesmo drama, falar do mesmo drama, respirar o mesmo drama. A tensão repetitiva havia tornado meus ombros duas rochas e eu já estava de saco cheio daquilo, precisava de férias.  

— Sabem de uma coisa? A revisão exaustiva de assuntos não traz nenhuma garantia se a mente não está apta para receber o conhecimento — senti-me agitada de repente. 

Os dois estreitaram os olhos para mim. 

— No que está pensando? — Lucas enfim perguntou, corajoso o bastante para enfrentar minha ideia. 

— Patinação no gelo e um bom chocolate quente — pulei para ficar em pé.

Jax e Jazzy estariam seguros com Ryan e Caitlin, eu agora me lembrava de que estavam nos fundos da casa fazendo bonecos de neve. A neve chegara no meio da tarde do sábado, trazendo a alegria para os pequenos que adoravam a estação. Eu não me importava muito comigo, mas de qualquer forma tinha aquela vaga impressão de que sobreviveria ao menos até o baile idiota — se Justin já não houvesse estragado tudo. 

Antes que meus amigos protestassem, acrescentei:

— Daí prometo que faremos horas de estudos a fio com bastante concentração. Podemos até madrugar. 

Eles se olharam, indecisos. Me preveni a um parecer desfavorável, saindo da sala aos pulos, com um breve aviso de que pegaria meus patins. Segui o ímpeto da diversão, concentrando minha atenção nos planos imediatos, em qual pista iríamos, qual lanchonete, o melhor agasalho... Mantive-me bastante ocupada, planejando. 

Mas, quando saí pela porta feito uma fugitiva e só avisei a Caitlin por mensagem de que estava indo dar um passeio, que tive a sensação, reforçada assim que desliguei o celular e liguei o som de Ava no máximo. Eu não estava escapando apenas dos estudos e da minha mente turbulenta. Precisava escapar de Justin, de todas as amarras dele em mim, indiretamente tentando me antecipar a algum corte definitivo. Precisava me lembrar de como era a vida sem ele, para ao menos também me concentrar apenas em mim como ele podia fazer muito bem com ele mesmo. 

Estar com Ava e Lucas era sobre isso, cuidar da minha vida privada. Eles não tinham relação alguma com Justin. Eu até que obtive êxito nos primeiros minutos. Encontrei a pista de gelo mais ridiculamente próxima e enfiei meus patins, uma sede desvairada por diversão. Ava e Lucas devem ter percebido alguma coisa, pelos olhares fugazes que me lançavam, mas não disseram nada, acompanhando meu ritmo. 

Deslizei pela cobertura lisa, sentindo a energia que corria por meu sangue. Aquelas lâminas sob os patins podiam representar algum nível de perigo, bem como o chão congelado garantindo quebrar meu nariz se eu caísse de cara. Aquela pequena adrenalina foi capaz de me distrair, desviar minha atenção para mim mesma, nos movimentos necessário para me manter em pé e intacta. E ainda haviam as provocações com meus amigos, risadas histéricas quando um de nós quase ia ao chão. 

Eu e Lucas quase nos chocamos e precisamos segurar um ao outro para não tomar um tombo fenomenal. Eu dei um gritinho ao agarrar seus ombros furiosamente enquanto ele se equilibrava com as mãos em meus braços. Deslizamos perigosamente até nos estabilizarmos, rindo emocionadamente em conjunto. Eu apoiei a cabeça no peito dele, oprimida pelo alívio. 

— Essa foi por pouco! — Ava comentou ao se aproximar de nós dois, avaliando a cena com um riso repicado. 

Eu me ergui assim que Lucas se afastou depressa, ao que parece preocupado com o que ela pensaria de nossa proximidade momentânea. Não havia malícia e de qualquer forma eu namoro então... Um namorado meio ausente às vezes, mas ainda assim contava. Aliás, o que ele estaria fazendo naquele momento? Qual Justin estava vencendo sua superfície?

Argh. E lá vinha ele infestar meus pensamentos. 

Seu nome e rosto em minha mente não foram recebidos com novidade. Percebi que enquanto eu me esforçava tanto para não pensar nele já o estava fazendo. Não era uma coisa natural. Suspirei derrotada, eu devia admitir de uma vez que nunca conseguiria fugir dele nem por um segundo. E, se pensasse direito, nem mesmo gostaria. Justin já era meu complemento. Não haveria Faith Evans sem Justin Bieber. E quando o mundo virou de ponta cabeça para tentar nos separar.... Literalmente havia virado de ponta cabeça. Tremi internamente ao me lembrar outra vez do meu período aterrorizante em Minneapolis. 

Fiquei momentaneamente desanimada e pedi licença para me sentar um pouquinho. Saí da pista e alcancei o banco bem ali na ponta, olhando distraída Lucas e Ava darem voltas não muito sincronizadas. Ava era muito melhor naquilo do que nós dois, e tentava ensinar nosso amigo a ficar ao menos em pé. 

Perguntei-me como Ava não conseguia perceber o olhar de adoração que Lucas lhe direcionava, tanta ternura, tanta atenção... Era impossível não ver. Então me lembrei do que Caitlin me dissera, que Justin me olhava como se eu fosse "o centro do universo". Seria possível que eu também estivesse tão cega por minha paranoia que não conseguisse ver que ele ainda me amava como antes?

Bom, se fosse assim, ele deveria começar a demonstrar melhor. Eu estava me sentindo bem abandonada e aflita com o futuro na maioria das vezes. 

Interrompi meus dramas no meio quando uma cena a frente chamou minha atenção. Lucas literalmente patinando no mesmo lugar, o braço direito estendido para buscar equilíbrio, seus olhos verdes esbugalhados de pânico. Ava segurava sua outra mão, tentando sustentá-lo, mas não estava dando muito certo. 

Levantei-me em prontidão para ajudar, e ainda colocava meus patins quando vi Ava mudar de estratégia, a par da derrota. Num movimento rápido colocou-se na frente dele para segurar seus dois braços. Mas era tarde demais. Os dois rodaram numa dança desengonçada e foram ao chão. Com aquele impulso humano sem sentido, me queixo caiu e cobri a boca com as mãos. 

Antes que eu pudesse ficar muito preocupada, percebi que o chacoalhar nos ombros de Lucas era de riso. Com uma vistoria rápida daquela distância, reparei que pareciam inteiros, nenhum membro estranhamente distorcido, nenhuma poça de sangue espalhando-se à sua volta. Além de que os dois estavam conscientes.

Consegui respirar, ganhariam apenas alguns hematomas. Ava mais do que Lucas, já que ela havia acabado embaixo do seu corpo. Ela estava com uma careta cômica enquanto dizia alguma coisa a ele, Lucas colocou uma das mãos na cabeça dela, como que para se certificar de que estava inteira. 

Abaixei-me para terminar de colocar os patins e ir ajudá-los a se levantar, mas quando ergui a cabeça alguma coisa na cena havia mudado. Os dois continuavam no chão, mas Lucas estava com um olhar diferente, intenso, fitando Ava. Ela estreitava um pouco os olhos, confusa. Precisei de um momento para entender, mesmo dali pude ver quando tomou a decisão. Eu queria gritar "Não, Lucas!", mas fiquei paralisada, como Ava. 

Lucas se inclinou e encostou os lábios nos dela levemente. Eu mordi a boca, nervosa. Encrenca. Independentemente da recepção de Ava, alguém estaria encrencado. Ethan ainda estava na equação. 

Não durou muito, Ava não reagiu, em choque, e Lucas pareceu voltar a si logo. Um selinho longo, mas capaz de um grande estrago — ou mudança. Senti a tempestade vindo antes de acontecer, um segundo inteiro em que os dois se olhavam de olhos arregalados. Alguma coisa no rosto de Lucas também apresentava uma empolgação crescente. No outro segundo, Ava o empurro de cima dela. Era hora de entrar em cena. 

— Lucas?! — O rosto dela havia virado uma pimenta. 

— Ava.... Eu... — ele tentou se levantar, gaguejando. 

Ela já estava em pé, evitando olhar para ele. 

— Espera! Ava! — Sua mão se esticou para tentar agarrar o braço branco, mas agarrou o ar. 

Nos encontramos no meio do caminho, e até meus olhos ela evitou, apressada em fugir. Lucas me olhou em desespero por ajuda. O que eu podia fazer? Olhei entre os dois, indecisa. 

— Droga! — Ouvi Ava xingar ao chegar na ponta da pista, relutante, ela se virou para mim — Faith... O... — apalpou os bolsos, depois me estendeu sua chave — Fiquem com meu carro — suspirou. 

— Não, Ava. Ryan vem nos buscar, fique tranquila. Pode ir. 

Ela me encarou por meio segundo, decidindo, mas seu desespero venceu e assentiu. 

— Desculpe, Faith — e sem esperar uma resposta, correu. 

Bem, nada como um drama alheio para nos distrair dos nossos próprios. Voltei lentamente para onde Lucas estava sentado com um olhar vazio encarando o nada. Estendi minha mão para ele, empática. Tive que esperar um pouco até que finalmente aceitasse minha ajuda. Ele parecia envergonhado demais para me olhar diretamente. 

— Vou pedir ao Ryan para vir nos buscar — quebrei o silêncio enquanto saíamos da pista. 

Ele só assentiu, cabisbaixo. 

Assim que liguei meu celular, recebi notificações de ligações perdidas e mensagens irritadas não respondidas do meu casal favorito. Imaginei se eles teriam reportado ao Justin meu sumiço repentino, só que ele ainda não dera sinal de vida. 

Quando liguei para Ryan, bastou dois toques para ser atendida. 

— O que você estava pensando, Faith? — Grunhiu, logo de cara. 

— Oi, Ry, pode buscar Lucas e eu na pista de patinação? — Pedi com educação, ignorando sua fúria. 

Ele suspirou alto. 

— Fale o endereço, estou a caminho. 

Sentei-me no banco de madeira com Lucas depois de desligar, passando minha mão aberta de luva para expulsar parte da neve.  Apesar de estar bem agasalhada, eu sabia que o contato congelaria minhas nádegas. Dito e feito, tremi com a temperatura se espalhando pelas minhas pernas e subindo por minhas costas.

Dois minutos de silêncio depois, ele expirou. 

— Ela vai me odiar agora, eu não planejei fazer isso, não assim, não agora, talvez nunca. 

Coloquei a mão em seu ombro, sem palavras prontas para dizer. 

— Bem, Lucas, imagino que vá ficar um pouco chateada agora, mas depois vai te perdoar — animei-o. Ava não costumava ser rancorosa, seu coração parecia marshmallow

— Foi um erro, não vamos mais poder manter uma amizade — lamentou. 

— Não seja tão negativo, dê a ela um tempo. Mas peça desculpas.

Perguntei-me se ela contaria a Ethan, e o que ele faria sobre aquilo. Lucas parecia estar pensando no mesmo que eu, gemeu baixinho. 

— Ethan e sua gangue vão acabar comigo. 

Mordi a boca, sem ter certeza de que não o fariam. 

— Pode pedir ao Justin e Ryan lutarem comigo? Eles são de dar medo. Na verdade, tenho certeza de que Justin acabaria com todos sozinho. Ele podia fazer pela nossa parceria de rockeiros

Emiti uma risadinha histérica. Ele tinha razão. 

— Claro, eu te empresto ele um pouquinho. 

Eu podia emprestar algo que não tinha? Se ele não tinha tempo para mim, não teria para Lucas. Ou só não tinha para mim mesmo? Ele podia estar propositalmente fugindo de mim, com aquela questão de indecisão sobre quem era. 

Uma buzina interrompeu nossos pensamentos e qualquer intuito de retomar a conversa. Ryan realmente voava com aquele carro. 

— Se divertiram, crianças? — Lançou a mim seu olhar de censura quando entramos.

— Claro —murmurei, sem culpa. 

Ele apertou os olhos, depois perguntou:

— Onde está Ava?

Lucas estava no banco de trás, mas eu quase podia ver sua careta. 

— Teve que ir embora... correndo. 

Ryan franziu a testa de desconfiança com o desconforto em minha voz. Por outro lado, não questionou. 

— Tudo bem. Te deixo onde, cara? — Olhou para Lucas pelo retrovisor. 

— Na verdade, Faith, se importa se eu ficar na sua casa mais um pouco? Podíamos continuar com os estudos — pediu, e eu notei sua agonia para não ficar sozinho. De fato, temia que Ethan o procurasse imediatamente ou fugia de seus pensamentos. 

— Claro, vamos continuar os estudos. 

Ryan olhou entre nós dois por um momento, curioso, mas novamente não disse nada. Sem dúvida havia captado o problema no ar. Eu não revelaria qual era, Lucas logicamente ficaria constrangido. 

Chegamos em casa e partimos direto para a sala. Ryan não nos acompanhou, pisando fundo enquanto se afastava. Não estava muito longe, por isso eu ouvi quando ele murmurou:

— E aí. Já achei. Trouxe ela pra casa, estava com o Lucas numa pista de patinação. É... Sim. Parece que vão estudar agora..... Beleza, mas... — o som ficou distante demais para que eu continuasse ouvindo. 

Eu tinha certeza de que ele estava falando com o Justin. Trinquei os dentes. Maldito, então comigo ele não podia falar, mas sobre mim e com Ryan sim. Não havia ao menos me dirigido uma palavra naquele dia inteiro. Deixara meu "bom dia" no vácuo eterno. Eu queria correr atrás de Ryan e tomar o telefone de suas mãos. Só a expressão desolada de Lucas me impediu. Que Justin e Ryan explodissem juntos! Eu não deixaria barato. 

Sentei-me no chão ao seu lado como uma boa mártir e empurrei um livro para ele. 

— Você tem umas perguntas para fazer. 

Com um meio sorriso, voltamos onde havíamos parado. Dessa vez, porém, eu não era a única a estar desmotivada. A preocupação em deixá-lo melhor me ajudou a ignorar um pouco a minha. Contudo, conforme o tempo avançava, meu progresso fora mínimo. 

— E então, qual é? — Cobrei sua resposta quando ele demorou mais de dez segundos para ao menos parecer que estava pensando sobre a matéria. 

Lucas passou a mão em seus cabelos enrolados, franzindo a testa de concentração.

— Sabe o que está me perturbando? De certa forma eu ainda estou um pouco... feliz? Satisfeito? Abobado? — lutou com as palavras, o vinco em sua testa se aprofundando — Eu esperei tanto por aquilo, Faith, e... — seus lábios se contraíram, tentando reprimir um sorriso — a boca dela é tão macia — balançou a cabeça — e ficar tão próximo dela, a ponto de sentir sua respiração no meu rosto. Merda.. Ela parece uma droga. E olha que eu nunca usei droga. 

Dei uma risadinha nervosa. 

— Ai, Lucas, você é completamente apaixonado por ela mesmo. — E eu não queria estar na sua pele, completei mentalmente. 

— Você vai me ajudar, Faith? — Olhou-me, inspirado — Vai dizer a ela que ao menos me perdoe? Eu prefiro ser amigo que nada. Acho. 

Não pude conter uma careta, sabendo que acabaria sobrando para mim. 

— Claro. O que acha de pedirmos uma pizza? Melhor respirarmos um pouco. 

— Ótimo — concordou, distante outra vez. 

Aquele era o pior grupo de estudos da história. 

— Vou ver o sabor que o pessoal quer. 

Fui direto ao jardim, mesmo que soubesse que não estariam mais ali, não ficariam tanto tempo assim no ar congelante. Talvez eu estivesse evitando de me encontrar com Caitlin. Se ela nem ao menos fora atrás de mim para me dar uma bronca, estava muito brava com minha fuga. 

Acabei encontrando os quatro na sala de jogos. Ryan jogava com Jax uma partida de ping-pong e Jazzy e Cait se concentravam no iPad. Bati na porta e pigarreei.

— Querem pizza do quê? 

As crianças gritaram sabores ao mesmo tempo, animadas. Caitlin, por sua vez, nem levantou os olhos para mim, respondendo:

— Já que você é tão autossuficiente poderia muito bem escolher sozinha. 

Revirei os olhos, mas antes que pudesse responder, meu celular estava tocando. 

— Ótimo, espero que seja o Justin — resmungou. 

— É o Wren — devolvi com um ar petulante, enquanto vibrava de alegria ao ver seu nome no visor. 

— Wren? — ela e Ryan trocaram um olhar. 

Ah! Eu ainda não havia contado a novidade, temendo uma reprimenda. Ops. Virei as costas e saí para ter privacidade. 

— Wren! — Saudei-o. 

— Oi, Faith. Tudo bem? — Sua voz parecia bem mais animada e confortável do que da última vez. 

— Melhor agora. Fico muito feliz que tenha ligado. Como vão as coisas? 

— Muito bem! Conversei com a Charlie, só estou ligando para avisar que vamos para aí na quinta sim. Ela adora o Canadá — ele estava radiante em anunciar as boas novas. 

— Ah! São ótimas notícias! Vocês serão muito bem vindos! — Eu estava chocada. Claro que queria que eles viessem, mas não pensei que aceitariam. Nem mesmo eu sabia como o pessoal os receberia — teria que trabalhar muito nisso — que dirá de sua parte. Wren era corajoso. 

— Será um prazer imenso. Você, hã... —o tom de voz dele mudou, hesitante — tem certeza de que vão gostar de me ver aí? 

Engoli em seco. 

— Claro, Wren — menti, porque eu não sabia nada —, você sempre foi da família. 

— Isso me deixa radiante. Saudade de vocês. Vou te mandar uma mensagem depois com mais informações sobre o voo. 

— Obrigada, Wren. 

Bom, como se eu já não tivesse conflitos demais para pensar. Eu só me arrumava confusão. Um raio para problemas. Wren também podia se sentir mal perto deles. Argh. Eu não pensava as coisas direito. 

Não seria fácil, e a cara de Ryan e Cait enquanto comíamos a pizza — com o sabor escolhido pelas crianças e Lucas somente, já que os avós e Pattie estavam no restaurante e o casal se recusara a responder — já adiantava isso. Claro que também podia ter algo a ver com os outros acontecimentos do dia. 

Estremeci ao pensar em como seriam suas reações quando eu contasse do jantar. Ryan, que achava muito difícil ficar calado e esconder seus sentimentos, grunhiu de repente:

— Wren. 

Arqueei a sobrancelha para ele. 

— Desde quando isso voltou, hein? — Investigou, rabugento. 

Ele era tão paranoico quanto Justin, então tinha dificuldades para acreditar em sua inocência. 

— Voltamos a nos falar na sexta feira, Ryan. Mais alguma pergunta? — Falei mal humorada. 

— Por que? — Exigiu saber, fitando-me como se eu tivesse neurônios a menos. 

— Porque ele sempre foi meu amigo — devolvi o olhar. 

— Ah, amigos, sim. Você tem um julgamento duvidosos sobre seus amigos — resmungou. 

Lucas, até aquele momento entretido com algo que Jax lhe dizia, nos olhou de rabo de olho. 

— Começando por você, claro.. 

Ele fez uma careta. 

— Justin adorou saber dessa reconciliação. 

Meu queixo caiu. O quê?!

— Será que eu consigo peidar sem que você faça um relatório completo para ele, Ryan? 

As crianças riram ao ouvir a palavra "peidar" e Catlin de fato segurava um sorriso. 

— Se ele está incomodado ou interessado, podia muito bem falar comigo sobre isso. Te pouparia o trabalho de fofocar como uma velhinha o tempo todo. Se bem que você deve gostar. 

— Ele gosta — Caitlin concordou. 

— Ei! De qual lado você está? — Ele a acusou com os olhos. 

— Da verdade — deu de ombros — Que anda junto com a transparência, coisa que você parece ter resolvido abandonar — ela agora olhava para mim. 

— Gente, não sei para quê tanto escândalo, estão convivendo muito com aquele lá. 

— Aquele lá? — Ryan arregalou os olhos de descrença para mim — Mais respeito com ele, Faith. 

— Bom, Ryan — larguei os talheres no prato — já que vocês se amam tanto e com você ele gosta de falar, deveriam namorar — abandonei a mesa com a pizza inacabada — Vamos, Lucas, vou te levar embora. 

Não vi se ele havia terminado ou não, focada na minha saída. Ouvi sua despedida breve e tímida aos presentes, em seguida, estava atrás de mm. 

— Hã, tudo bem, Faith? — Me alcançou. 

— Claro. Vamos pegar suas coisas. 

Então era isso? Justin e Ryan deviam conversar o dia inteiro nas minhas costas, enquanto minhas mensagens e ligações ele evitava. Por que me evitava? O que eu havia feito de errado? E se me evitava, por que ainda queria saber de mim? Para garantir que eu não colocara sua família em perigo? Já que era uma burra impulsiva. 

Milhões de vespas ferroavam meu cérebro, eu estava tão chateada e brava que queria chorar. Mas mordi bem a boca e garanti que não me humilharia assim na frente de Lucas, que passou o trajeto inteiro em silêncio, provavelmente preso em suas próprias preocupações também. O clima dentro do carro não estava dos melhores, nossas mentes cheias preenchiam todo o ar. 

Estava tão afobada que quase passei da casa de Lucas, mas no último segundo ele se manifestou e eu encostei o carro. Respirei fundo para destravar os dentes e lhe dar uma despedida decente. Ele examinou minha expressão por um breve momento. 

— O amor está mesmo em crise atualmente, não é? — adivinhou, e eu sabia que se referia a nós dois. 

Concordei com um sorrisinho desanimado.

— Se precisar estou aqui. Se quiser conversar, tem meu número — disse-me, terno. 

— Eu também. Se precisar das minhas artes em defesa pessoal também. 

Demos uma risadinha e em seguida um abraço rápido. 

Voltei para casa muito lentamente, não queria enfrentar Caitlin e Ryan, ou estar perto de algum ser humano. Talvez... Talvez eu precisasse ficar perto de um ser humano específico. Para termos mais uma conversa sincera. Será que ainda tinha espaço para mim na sua vida? Ou sua indecisão também era sobre mim? Eu precisava que ele me garantisse que eu estava sendo uma boba. Não era possível que depois de tudo... 

Parei o carro na garagem. Eu tentaria mais uma vez. 

Chamou pelo menos umas seis vezes, e eu imaginei que cairia na caixa postal como sempre, mas no último momento ele atendeu. Meu coração literalmente parou no peito. 

— Faith? — Sua voz não parecia irritada, cansada ou reprovadora como imaginei que estaria. Apenas... vacilante.  

  E eu quase chorei só de ouvir aquele timbre rouco e grave que arrepiava todos os míseros pelos do meu corpo. Todo o meu ser clamava por ele de maneira insana. Não era justo. Não se pra ele não era mesma coisa mais. 

— Oi — eu disse tarde demais. 

Um silêncio estranho se intrometeu entre nós, e aquilo me apavorou. Devíamos nos entender, não? 

— Se divertiu hoje? — Ele perguntou, mas não parecia uma forma de me cobrar por minhas aventuras do dia como seria o normal dele fazer.

— Ah, foi tudo bem. E você, se divertiu?

Pausa. 

— Hm... Pode-se dizer que sim. 

Como poderia ter se divertido se estávamos distantes daquele jeito? 

— Entendi. — olhei a hora no painel do carro, dez da noite — Não voltou ainda? 

— Voltei. — Respondeu, apenas. 

Mordi o lábio, não sabia se para evitar que o xingasse por não ter me ligado para nos encontrarmos ou ter imediatamente nos visto ou para não chorar mesmo. Pagaria aquele papel ridículo até quando?

— Ah. 

— Eu... preciso desligar agora. 

Previsível. Meus lábios tremeram. Ele realmente estava escapando entre os meus dedos. Não havia como mentir, cada vez mais suas distâncias eram maiores. E eu havia prometido lutar até o fim. 

Mas... E se no fundo ele não me quisesse mais? E se não me deixasse lutar por ele?

Tentei falar através do bolo em minha garganta. 

— Tudo bem. Boa noite. 

— Faith... — hesitou — Boa noite. 

Quando ele desligou, eu me debrucei no volante e a umidade em meus olhos transbordou. Até certo ponto eu podia ser considerada uma covarde e meu maior medo naquele momento era saber de modo direto se eu ainda era sua certeza como ele era a minha. Então sim, eu choraria de medo de perdê-lo, porque não podia nem queria me imaginar sem ele. E cruzaria bem os dedos para que ainda fosse assim para ele também.