Leitoras com Swag

Hey garotas, beliebers ou não beliebers. Só estava faltando você aqui! Nesse blog, eu, Isabelle, faço IMAGINE BELIEBERS/ FANFICS. Desde o começo venho avisar que não terá partes hots nas Fics, em nenhuma. Repito, eu faço 'Imagine Belieber' não Imagine belieber Hot. A opinião da autora - Eu, Isabelle - não será mudada. Ficarei grata se vocês conversarem comigo e todas são bem vindas aqui no blog. Deixem o twitter pra eu poder seguir vocês e mais. Aqui a retardatice e a loucura é comum, então não liguem. Entrem e façam a festa.
" O amor não vem de beijos quentes. Nem de amassos apertados. Ele vem das pequenas e carinhosas atitudes."- Deixa Acontecer Naturalmente Facebook.
Lembrem-se disso. Boa leitura :)

Com amor, Isabelle.

terça-feira, 31 de outubro de 2017

One Love 23

Maya não era tão burra assim, não estava em casa. Fiquei, no máximo, aliviada por ela. Não desejava para ninguém encontrar esse demônio louro. E eu ainda não havia aceitado a livre decisão de Annelise nos ajudar. Ela devia estar recebendo alguma coisa em troca disso. Alguma coisa muito valiosa. Eu tinha arrepios só de pensar no que Justin podia estar lhe oferecendo
— George me mandou ficar de olho nela. Essa mulher está ferrada. Tenho certeza que não vai aparecer na Companhia hoje — Annelise nos contou ao entrar no banco passageiro de trás. Segundo sua teoria, deixar seu carro na rua de Maya a apavoraria, e Annelise adorava uma caçada.
Evitei o impulso de apontar o dedo e acusá-la de olhar ameaçadoramente para mim ao dizer essa última parte. Além de ser infantil, eu não queria chocar suas palavras contra a minha, temendo não saber de qual lado Justin ficaria.
— Já está tudo planejado. Marquei uma reunião com ele às nove da manhã. Entro e saio como um pegasus cor de rosa — ela se apoiava nos bancos da frente, sua voz irritante soprando diretamente nos meus ouvidos.
Justin respirou fundo.
— Eu te falei para não fazer isso.
— Suas ideias não são mais funcionais, e as dela nem se fala. Deixa eu adivinhar, ela mesma quer entrar na sala e conseguir sozinha extrair o contrato?
— Ela está bem aqui — rebati, inflamando minha ira por ser descartada da conversa.
— Você quer que eu confie totalmente na sua honestidade para pegar o nome do contratante?
— Vamos ser realistas. George confia em mim de olhos fechados, você sabe disso, por isso fui transferida — pela visão periférica, percebi a mão dela serpentear pelo ombro dele, a caminho da nuca. Suas palavras me davam indícios de uma história que eu não conhecia, mas deveria.
Me remexi no banco.
— E isso não deveria ser o exato motivo para eu não confiar em você?
As unhas grandes e pretas dela alcançaram seu objetivo, roçando lentamente a pele dele. Meu coração perdeu o compasso. Procurei conforto em uma suposta expressão de repulsa em Justin, mas ele permanecia compenetrado no trânsito, impassível.
Ela riu. Uma maldita risada juvenil adorável, nada parecida como o som de uma foca engasgando que geralmente minha garganta produzia.
— Eu também não confiaria em mim. Então te trouxe uma escuta e uma câmera.
Os movimentos passaram a ser circulares. Eu ia vomitar.
— Até onde sei, isso tudo pode ser planejado com George.
Sua falta de confiança nela deveria me animar, mas percebi com desgosto que ele nunca confiou em mim também.
Annelise expirou, tirando as mãos dele. Voltei a respirar.
— Sou sua melhor chance, J. Vai ter que dar esse tiro no escuro. Você sempre gostou de coisas arriscadas, vamos lá.
Não consegui evitar uma olhadinha de completo desprezo pra ela. Seu sorrisinho presunçoso pareceu crescer por isso.
— Espero que não tenha se esquecido também o que acontece com as pessoas que me traem — seus olhos dispararam para o retrovisor, para fitá-la. A ameaça tão concreta quase se tornou palpável no ar.
Annelise, ao invés de tremer de medo — a reação mais apropriada para uma situação daquelas —, abriu um sorriso gigante diante do desafio. Ela adorava ser subestimada. Se não estava pensando em traí-lo antes, o faria agora só pelo gosto do jogo.
— Você fica tão sexy quando fala desse jeito.
Identifiquei o ódio mais feroz que eu já sentira tremer em minhas veias, lutando para se exteriorizar e amassar o crânio dela contra o pneu e o asfalto. Agarrei a ponta da minha blusa e controlei meu ciclo respiratório repentinamente desregulado. Eu não tinha direito de dar um escândalo. 
Deus, eu não estou com moral para falar coisa alguma, mas, a existência dela era mesmo necessária?
De repente fiquei grata por ter sido criada por Eleanor e Bryan publicamente. Pratiquei durante anos meu controle emocional. Não era expert, mas dava para o gasto — pelo menos eu pensava, agora quem me conhecia dizia o contrário. Os dois esperavam uma reação minha e eu simplesmente fingi que não havia ouvido. Quase tive uma parada cardíaca, porém, nada com que eu não pudesse lidar abaixo de sete palmos da terra.
Não sei dizer se houve mais alguma interação no carro, a descarga furiosa exigiu tanto de mim que entrei em um estado de inércia. Quando dei por mim, estacionávamos uma quadra de distância da Companhia, o motor ainda ligado. Só aí entendi que Annelise planejava tomar meu lugar na sala de George, e, para ser sincera, a informação não me passou no filtro adequadamente, de modo que eu estava disposta a fazer de tudo para que ela apenas ficasse longe de nós dois, independentemente do risco de ficar sem meu contrato por mais um dia. Se ela queria entrar na Companhia, vá com Deus! E se George a flagrasse, melhor ainda!
A porta traseira se abriu, e depois Annelise estava inclinada na janela do motorista.
— Vou colocar no banheiro assim que entrar. Como ainda falta mais de meia hora para a reunião, se quiser, eu posso te distrair um pouco — ela sugeriu com um tom provocativo.
Barrei a interpretação infeliz que eu faria do que ela disse.
— Se eu não tiver notícias em dez minutos, entro atrás de você — Justin se limitou a responder.
Annelise pareceu ter encontrado um sentido duplo para satisfazê-la.
— Me desejem sorte.
Ela beijou a ponta dos dedos e os colocou rapidamente na boca de Justin. Depois piscou pra mim e saiu confiante. Mordi a boca, segurando a umidade que eu sentia ameaçar meus olhos. Meu corpo se sentiu extremamente injustiçado por não poder extravasar a ira de nenhuma forma, iniciando um protesto que terminaria em um colapso se eu não fizesse alguma coisa sobre. Virei a cabeça para a janela, comecei uma contagem inútil e esperei passar.
Justin se inclinou para trás e pegou um notebook, abriu no colo e esperou ligar. Não percebi que prestava atenção em mim até que falasse:
— Eu sei que não confia em Annelise, mas eu vou perceber se ela tentar nos passar a perna. Eu a conheço bem. Não sairemos daqui sem seu contrato hoje.
Eu não duvidava que ele a conhecesse bem. E isso não era nada animador.
Precisei de ar. Abri a porta e coloquei meus pés na calçada, soltando o ar devagar pela boca. Passei rápido as costas das mãos embaixo dos olhos quando duvidei da minha fortaleza. E fiz bem.
— Faith, qual é o problema?
— Você não está me perguntando isso — me ouvi como se estivesse sendo estrangulada — Me deixe quieta.
Olhar pra ele doía, mas não ver seu rosto me inquietava. Eu era uma causa perdida, dissolvida no caos que minha vida havia se tornado.
— Sei o que você está pensando.
— Sabe? — debochei.
— Se eu estiver errado, me corrija. Você provavelmente me odeia agora, pensa que sou a criatura mais abominável da terra, a ponto que tenha mal-estar só de ficar perto de mim — ele me esperou contestá-lo. Como não o fiz, prosseguiu — E um canalha por ter um relacionamento amoroso com uma pessoa como Annelise.
Me perguntei se ele também podia ouvir meu coração se partir em mil pedacinhos. Embora eu já presumisse uma coisa daquelas, ouvi-las de sua boca não tornava a realidade mais amena. Empurrei a bile dotada de rejeição goela a baixo. Senti meu corpo se escolher e tive a impressão de que o processo continuaria até me varrer da face da terra.
— Mas eu não tenho. Não mais. Há dois anos, quando ela foi transferida para cá. Nunca tivemos uma coisa tão séria, de fato. E talvez agora pense que seremos a mesma coisa. Sei que ela pode perceber minha rejeição, só que nunca vi alguém tão obstinado como Annelise. E eu não vou lhe dizer para dar o fora antes dela nos dar o que precisamos.
— Então vocês...? — as palavras se atropelaram para fugir da minha boca.
— Não encosto nela há meses, e também não tenho vontade — a voz dele assumiu um tom solene.
Me virei completamente na sua direção, julgando sua honestidade através da expressão. Imperceptivelmente, suas sobrancelhas se franziam de concentração. Era importante para ele que eu acreditasse em sua palavra. Justin tinha certa obsessão com a honra que possuía. Ele era o que era. Nada mais e nada menos. E ninguém podia duvidar disso. Não ter interesse em mim não queria dizer que ele apelaria para alguém como ela. Tudo bem.
Deixei meus músculos relaxarem, fazendo a analogia ridícula com o alivio que eu sentia quando estava com a bexiga completamente cheia e podia esvaziar finalmente o liquido ácido de substâncias metabólicas. Annelise não era muito diferente de uma urina fedida mesmo. E eu estava louca para lhe botar pra fora. Se eu a visse encostar nele de novo, cortaria seus dedos com uma serra cega. Nunca odiei alguém da mesma forma que a odiava.
— Por que terminaram?
Ele deu de ombros, os traços mais suaves ao perceber que eu parecia acreditar nele.
— Não foi uma coisa combinada. Ela veio para cá e não entramos mais em contato.
O fato de não ter havido uma briga ou uma decisão por parte dos dois suscitou um pouco de incômodo.
Arqueei a boca para o lado apenas para que soubesse que eu o ouvia. E realmente achei que eu não diria mais nada.
— Acho que ela combina mais com o Guilherme.
A covinha que ele tinha do lado direito do rosto deu sinal de vida.
— Eu não me importaria em preparar um encontro para os dois ainda hoje.
Contive o riso. Foi bom ainda desfrutar de autocontrole porque não é ideal rir de um possível planejamento de assassinato.
Justin pegou seu café no porta-copos e bebericou. Ele não podia me enganar com o movimento “despreocupado”. Eu sabia que tinha alguma coisa em mente. Precisei esperar por meio minuto.
— E falando em encontros... Como está sua situação com Rafael?
E aí estava. Criando um clima casual, Justin pegou uma rosquinha do saco pardo que eu deixara no assoalho do carro, como se minha resposta não fosse tão importante assim. Era evidente que, no mínimo, ele queria saber se seu trabalho como cupido havia funcionado.
— Não sei o que dizer — respondi quando incentivada por seus olhos.
Ele encarou a rosquinha de novo.
— Hm, não acha ele, legal?
— Acho.
— Divertido?
— Sim.
— Talentoso?
— Também.
— Bom dançarino?
— O quê?
Ele deu uma mordida na rosquinha, mastigando com calma. Não deixei que me inquietasse com expectativa, quem queria resposta era ele. Só depois de engolir, continuou:
— Eu soube que ele dança tango.
— Dança.
— E aí?
— E aí o que?
— Dançou com ele?
— Não — eu parecia quase intrigada com sua pergunta, e não devia. O que teria de errado se eu, uma mulher totalmente desimpedida, dançasse tango, uma dança extremamente sensual, com Rafael? — Você já?
Vi seu sorriso cômico atrás do copo de café.
— Não.
Comecei a enrolar meu cabelo no dedo involuntariamente. Um tique nervoso que só aparecia quando eu estava na defensiva. Naquele momento, não havia razão de estar acontecendo. Justin também percebeu.
— E... o acha atraente?
Tive que olhá-lo nos olhos. A pergunta pairava entre nós com certa toxidade. Repentinamente, Justin perdera o tom despreocupado. Minha resposta parecia questão de utilidade pública. Não encontrei razões para mentir.
— Certamente — mas não mais do que acho você, acrescentei mentalmente.
Ele nem digeriu minha resposta.
— E o que ele representa para você?
Respirei devagar. Entretanto, já havia decido nem ao menos pensar sobre o assunto. Não que Rafael não fosse importante o suficiente para que eu pensasse nele, embora eu o conhecesse apenas há uma semana. Tinha em mente outras ideias para uma conversa franca com Justin.
— Por que isso importa pra você?
Elenquei preliminarmente as respostas prontas que ele podia me dar. Só me restava torcer para que ele fosse mais honesto do que isso.
— Pensei que pudéssemos ser amigos.
Amigos, claro.
Me escondi atrás de uma falsa necessidade de amarrar meu tênis já amarrado. Abaixei-me no banco, desfiz o laço e o refiz lentamente enquanto dizia:
— Que tipo de amigo você quer ser? Só por aparência ou um amigo de verdade?
— Quero que conte comigo.
— Por quanto tempo?
Propositalmente ou não, sua voz endureceu.
— Por quanto tempo precisar.
Meu álibi para evitá-lo chegou ao fim. Me endireitei, enterrando a covardia. Analisando seu rosto, eu podia dizer que agora ele era quem estava na defensiva.
— E quem define quando precisarei ou não?
Deveria ter previsto que essa ele não responderia. Justin voltou a atenção para seu notebook depois de me encarar por segundos, se distanciando outra vez. Bela amizade eu teria se confiasse completamente numa pessoa dessas. Decidida, eu não desviei o olhar dele, transmitindo toda a minha mágoa e decepção. Seu maxilar travado demonstrava que ele não estava sendo capaz de me ignorar o bastante.
Não demorou muito para que desistisse e me olhasse de volta, gravemente sério.
— Faith, não tenho a intenção de te machucar.
Nostalgia me trouxe o dia em que estivesse na sua casa. Suas palavras foram quase as mesmas, e ainda assim, ali estávamos nós.
— Quer uma dica? Fale comigo para saber o que me machuca. Começando por não desaparecer sem pelo menos me avisar antes.
Ele molhou a boca, desviando rapidamente o rosto para que eu não visse alguma emoção que passou por ali. Apostei alto que era culpa. Ele já tinha um novo plano para desaparecer da minha vida, exatamente como ouvi na noite passada.
O mais fácil e saudável seria deixá-lo ir de uma vez. Eu me sentia uma idiota agarrando um fio de alta tensão de pés descalços numa poça de água. Depois de tanto sofrimento, presumia-se que eu fosse esperta o bastante para desistir. Presumia-se.
— Se você quiser assim, tudo bem.
Meus dedos se fecharam firmemente em volta dos meus joelhos, minha forma de trazer ao mundo exterior toda a força que fazia para não me deixar acreditar em suas palavras baratas de novo. Ele captou o movimento, e no próximo segundo, levou a ponta dos dedos para as costas da minha mão, num gesto hesitante de conforto que me deixou paralisada.
— Amigos? — levantou as sobrancelhas. Mentalmente, eu o via levantar uma bandeira branca.
Eu não queria concordar. Todo mundo sabe que amigos geralmente não sentem o coração disparar pela presença do outro, muito menos o estômago se revirar inteiro cheio de vespas, ou as pernas tremerem ameaçadoramente. Amigos não sentem cada célula do corpo implorar pela do outro, numa atração irresistível magnética.
E apesar de conhecer de cor e salteado tudo isso, fiz um breve movimento positivo com a cabeça. Ele deu um sorriso pequeno por minha resposta.
Pensei se poderia sugerir a concretização daquela espécie de pacto como Crowley em Supernatural, um beijo lento com gosto de perigo. Me dei um beliscão imaginário.
O fato era que eu preferia ser amiga dele do que nada. Eu precisaria aprender alguns limites? Que seja. Minha boca formigaria para lhe dar um beijo? Okay. Desde que ele estivesse comigo, eu podia suportar coisas secundárias.
— Mas ainda estou furiosa com você — acrescentei.
— Nunca vou conseguir te compensar por isso, mas vou tentar — me prometeu. Seus dedos abriram espaço entre meu aperto no joelho para alcançarem minha palma, voltando-a para cima. Em seguida, encaixou-a com a sua, o dedão circulando leve e carinhosamente por ali. Ele engoliu em seco. Que comecem os jogos — Preciso te dizer que senti sua falta, Faith.
MAYDAY! MAYDAY! MAYDAY! MAYDAY! MAYDAY! MAYDAY! MAYDAY!
Sufoquei o caos quando ele me fitou como ninguém havia feito em toda a vida, me vendo como o todo que eu era, alma, carne e osso.
— Senti sua falta pra cacete — ele disse mais baixo, mas nunca esteve tão audível.
Ao mesmo tempo que eu lidava com a situação grave da lava fervente derretendo todos os meus órgãos, precisei aderir a informação de sua mão livre se aproximando do meu rosto para colocar as mechas da frente do meu cabelo atrás das minhas orelhas, lhe dando uma visão ampla do meu rosto corado. Tremi disfarçadamente com o contato rápido das costas de seus dedos nas maçãs do meu rosto.
Foda-se a amizade! Agarre ele, agora! Ele pediu por isso!
Não, não, não, não.
Sim! Sim! Sim! Sim!
Implorei em silêncio para que ele parasse de me olhar daquele jeito. Depois supliquei que se aproximasse mais e não desviasse o olhar. Então clamei por misericórdia. E fui ao delírio quando ele não fez nem um nem outro, entreabrindo a boca.
Desgraça, se não for pra falar alguma coisa, fecha essa caralha.
Não, me deixe ver a língua também!
JESUS, ME SALVA!
— Quanto você sentiu minha falta? Se quiser, te faço esperar mais um pouco — pensei que um demônio estivesse possuindo o notebook de Justin. A realidade era bem pior, Annelise enfim ligara a câmera escondida e a escuta.
Não me senti tão livre quanto esperava sentir quando ele me libertou do poder do seu toque e olhar, fazendo uma careta para a tela pequena. Alguma coisa parecida com uma risada tentou sair pela minha boca. Acabei engasgando.
— E lá vamos nós — ele disse sem ânimo, vestindo a armadura emocional milimetricamente organizada para seus momentos responsáveis.
Annelise estava de frente para o espelho no banheiro de mármore, inclinando-se sobre a pia demasiadamente para retocar seu gloss. Tínhamos a visão perfeita do seu decote no reflexo. Para mim, parecia o lugar ideal de colocar um explosivo.
Ela pigarreou, deixando as costas eretas e uma expressão plena de capa de revista. Sim, definitivamente, eu a odiava.
— Vou dar uma passada no refeitório, preciso comer. Depois posso voltar ao banheiro se quiser, J.
Só até ela conseguir o contrato, Faith, depois pode se livrar dessa cobrinha.
No fim, eu preferia que ela fosse bem-sucedida, então. Procurei a câmera para saber se estava à vista. Mesmo sabendo que estava lá, eu não conseguia encontrá-la. Minha análise não era lá a melhor coisa para se levar em conta. Me inclinei sobre o ombro de Justin para enxergar melhor, sem deixar de ficar nervosa com a proximidade. Após passar por um teste alto de resistência, o cheiro de seu perfume parecia estar em mais evidência.
Distraia a cabeça.
— O que você ofereceu para que ela concordasse em ajudar?
Justin inclinou a cabeça, demonstrando que era óbvio em se tratando dela.
— Uma boa quantia em dinheiro. Não precisava de tanto, na verdade, ela é fissurada por desafios.
Melhor do que eu pensava.
— E onde arrumou esse dinheiro?
— Era meu. Nada que fizesse uma grande diferença na minha conta — banalizou.
Aham.
— Pelo que eu saiba, a Companhia ficou com todos os seus bens.  
Ele nem piscou.
— Algumas pessoas estavam me devendo algum dinheiro. Só cobrei a dívida.
Nem se eu me esforçasse podia imaginar Justin batendo palma na casa de conhecidos e pedindo gentilmente o valor devido. De qualquer modo, ele também não podia colocar a cara a tapa, então...
Não era da minha conta mesmo.
Annelise se sentou de frente para dois homens bombados, conversando animadamente sobre uma vítima que o moreno havia derrubado em menos de um segundo, segundo ele. Os dois a olhavam com reservas, embora demonstrassem estar a vontade. Infelizmente, não havia outra palavra que definisse aquilo a não ser respeito.
Preferi voltar à minha conversa.
— Foi o suficiente para os cinco meses?
Justin meneou a cabeça.
— Ainda assim precisei arrumar uma coisa no Canadá. Mas não é importante. Será que Hanna e Caleb estão dando trabalho para Ryan e Caitlin? Com o humor de Caitlin, eu diria que é bem possível o contrário. Rafael também está com eles, certo? Pobre homem.
Vagamente, eu percebia que ele estava me distraindo. A jogada foi de mestre, entretive-me com o assunto.
— Hanna não atura muito mal humor alheio, quando não se trata de mim. Se eu olhar o celular aposto que vou ler muitas mensagens ofensivas.
Ele deu uma risadinha. Sinos divinos tocaram nas igrejas do mundo inteiro.
— Onde você quer que eu te deixe para que eles te busquem quando sairmos daqui?
— O que quer dizer?
Ele já planejava desaparecer?
Minha voz entregou parte do meu pavor de modo que ele investigasse meu rosto para se certificar de que eu estava bem.
— Presumo que não queira que Hanna e Caleb saibam que estou vivo. Também não acho muito seguro que saibam. Você não contou, certo?
Neguei, parcialmente mais aliviada.
— Mas não quer dizer que você não possa ficar lá. Podemos dar um jeito de te esconder.
— Claro. Conversamos sobre isso depois — ele soou evasivo.
Praticamente me vi agarrada a perna dele como um coala para que não fosse embora.
Então a cena transmitida em seu notebook mudou. Annelise olhou seu celular, e todos lemos a mensagem que adiantava a reunião com George para aquele momento caso ela já estivesse na Companhia, ele tinha compromissos importantes para depois. A voz paranoica na minha cabeça já começou a cogitar a ideia de George ter descoberto que Justin estava aqui.
Comecei a roer as unhas. Senti necessidade de confirmar.
— Se Annelise estiver em apuros, entraremos para ajudá-la?
Justin me olhou de soslaio.
— Certo. E caso eles descubram que estamos aqui, quais são nossas chances de sairmos antes que nos peguem?
Ele estalou a língua, despreocupado com a possibilidade, mas eu vi que olhou pelo retrovisor.
— Grandes. Já estou pronto para a fuga.
Era verdade. O motor do carro ainda estava ligado.
Observamos em um silêncio tenso enquanto Annelise subia as escadas, as vezes ela mexia no cabelo, assoviava, aparentemente tranquila. Eu não sabia dizer se ela se sentia mesmo daquela forma.
Depois de passar pelos seguranças que me barraram no sábado de manhã no topo da escada, ela seguiu o corredor. A última porta — dupla de ferro majestosamente forjado — era guardada por três seguranças. Eles a cumprimentaram como o restante das pessoas, uma forma de tratamento tão diferente do que vi com Maya que quase senti pena dela. Maya parecia mais um filé mignon desfilando pelos corredores da Companhia.
Eu ri de nervoso quando a passagem de Annelise foi liberada.
— Parece mesmo o escritório do Poderoso Chefão.
Justin confirmou com a cabeça.
— George idolatra Corleone, embora não partilhe do ideal de que a família é o bem mais precioso a ponto de querê-los fora do negócio.
Os móveis espalhados pelo cômodo eram de uma madeira escura, combinando com o piso que aderia o clima sombrio. A mesa vintage enorme se destacava no centro, e George, num terno que podia ser capaz de matar a fome de um país, se sentava atrás dela em uma cadeira estofada. Ele olhou diretamente para Annelise, me dando a impressão de que era a mim que encarava.
Esqueci como se respirava. George tinha o poder de arrepiar de medo todos os pelos em meu corpo só com um olhar, eu não sabia como Justin e Annelise tinham coragem de enfrentá-lo. Meu plano de encará-lo sozinha mais cedo se apresentou como a maior idiotice já passada na minha cabeça.
 Anne! — o sorriso estampado em seu rosto velho e poeirento foi profundamente mais sincero do que o apresentado a Justin quando estivemos no baile idiota do ano passado — Como vai a minha menina?
Ela estendeu a mão para pegar a sua e deu um beijo em cima daquelas rugas centenárias cruéis. Através da minha névoa repentina de terror, imaginei se Justin não se incomodava que ele a tratasse melhor do que a seu neto de sangue. Consegui ainda me perturbar com o fato de que Annelise era mais do que aprovada por George para estar num relacionamento com Justin.
— No que posso ser útil? — ultrapassados os cumprimentos, ele foi direto ao ponto, mas não por impaciência.
Segurei minha língua para não fazer a pergunta indelicada a Justin. Sua ex já dormiu com seu avô?
 Faith Evans é um pé no saco, e não tenho certeza de que ela está levando a sério minha contagem — pausa para os dois rirem. Ela não me enganava, aquela parte não era encenação.
— Eu te disse, não foi? Justin nunca me decepcionou tanto. Que Deus o tenha, mas decaiu muito o nível. Talvez tenha enlouquecido de vez.
Um som estranho de desprezo, indignação e ressentimento foi produzido pela minha boca.
— George sempre foi mentecapto — Justin banalizou.
Eu pediria a tradução para aquela palavra, mas estava compenetrada demais. Pelo contexto, já tinha o conhecimento de que era alguma coisa ruim, e era o que bastava.
— Com certeza. Mas então, eu estava pensando, para me ajudar a convencê-la, achei que podia te pedir o contrato dela. Suspeito que tenha alguma história aí no meio que possa me ajudar.
Ele colocou a mão no queixo, refletindo.
— Talvez possa. Ela é totalmente débil, só meio teimosa. Se for apertada do jeito certo, provavelmente aceite uma troca de informações.
Arfei. DÉBIL É SEU OVO, SEU OTÁRIO!
— Não dê ouvidos a essa chaminé humana, Faith. Acredito que macacos tenham uma capacidade cognitiva maior do que a dele.
— Você sabe que confio em você, Anne. Posso ficar tranquilo que seguirá o regulamento? O contratante não será perturbado? Se descobrir que estamos investigando-o, ou acontecer alguma coisa com ele, nosso valor no mercado pode sofrer algum dano.
— Prefiro perder a vida a causar algum dano a essa Companhia, George — Annelise disse com convicção demais para me deixar com uma pulga mastigando minha orelha. Ou ela era burra o suficiente para mentir na cara dura para aquele homem com síndrome de Napoleão, ou estava nos passando a perna.
— Essa é a minha garota — George aprovou, os olhos ficaram pequenos para sorrir com todo o rosto.
Ele se levantou da sua poltroninha de rei e caminhou até sua estante, escolhendo entre as pastas pretas. Voltou com uma volumosa na mão, e assim que a colocou sobre a mesa, eu consegui ler o título: “Figuras públicas — Boston”.
Fiquei pasma com o plural e a especificidade do lugar. Boston era apenas uma cidade de Massachusetts. Quantas figuras públicas de cidades e estados diferentes havia na sala de George? E quantas em Boston? Eu os conhecia? Meu coração apertou ao pensar na probabilidade dos Peters estarem ali.
George passou uma das folhas para Annelise, escorregando o papel pela mesa.
— Obrigada, George, te prometo resultados.
Ouvi meu batimento cardíaco latejar nos ouvidos. O nome da pessoa responsável por chacoalhar todas as estruturas dos Evans estava a dois segundos de mim, e só naquele momento percebi que não me preocupei o suficiente com essa incógnita. Eu centrara toda a minha vida em Justin e deixei o verdadeiro demônio quieto.
Justin e eu nos aproximamos da tela do notebook quando Annelise virou a folha e engolimos as letras. Tive que ler outra vez, com a pressa da ansiedade não havia conseguido apreender a palavra formada. Então, li outra vez, porque eu tinha certeza que havia lido errado. E mais uma, porque pensei que eu finalmente estava precisando de óculos. Li e reli por mais vezes que eu possa contar, até Justin amaldiçoar o nome em voz alta e eu começar a cogitar que o problema não era comigo.
  

terça-feira, 24 de outubro de 2017

One Love 22

Recobrando a consciência, a primeira coisa que senti foi a rigidez do meu corpo, a ponto de provocar uma dorzinha constante e chata, principalmente em meus ombros. Tentei me mexer antes de notar que o espaço era extremamente limitado, e depois, a textura, contraditoriamente macia e lisa sob meus dedos, me obrigou a abrir os olhos.
Tive, então, a visão mais gloriosa que poderia ter nesta terra. Eu não sabia como aquilo acontecera, mas, minha cabeça repousava na curva do pescoço de um Justin vivo — o que explicava o aroma masculino quente e levemente suado que meu nariz acusava —. Eu espalmava seu peito desnudo com a mão direita, a esquerda fechada em punho entre nós dois. Ele me abraçava com o braço esquerdo enquanto o outro pendia do sofá onde nos encaixávamos.
Subi meu olhar para seu rosto, ali tão perto do meu e extremamente sereno, as feições limpas de quem tinha um sono tranquilo. Prestei atenção no levantar mínimo de seu peito conforme inspirava e expirava. Ouvi mais uma vez o som do seu coração e me policiei severamente para que não iniciasse uma série de carinhos e beijos. Daquela forma, era muito fácil imaginar que ele era meu, que nada entre nós havia mudado — mesmo com seu novo corte de cabelo.
Praticamente, senti minhas pupilas se dilatando. O coração batendo forte e saudável. A conversa de Justin e Rafael parecia ecoar em minha mente de poucos em poucos segundos, mas, naquele momento, se dissipou. Consegui subir mais alto nas nuvens do que um avião. Devido a este fato, percebi quando a vozinha no fundo da minha cabeça me avisou que não se passava de um sonho ou mera alucinação.
Não me importava. Ignorei os protestos da minha musculatura cansada e me aconcheguei nele, notando que, mesmo naquela posição desconfortável, aquela havia sido a melhor noite de sono que eu tivera em meses, sem sonhos perturbadores e inquietações.
Quando dei por mim, analisava os detalhes de sua boca rosada e pequena. A noite de inércia deixara que se enrugasse um pouco. Uma coisa muito bonita de se ver, diga-se de passagem. Muito convidativa. Me afastei da tentação, e ali estavam, seus olhos bem abertos me encarando. 
Paralisei. Não era nada estranho acordar com alguém secando seus lábios, claro. Mas Justin não pareceu perturbado. Pelo contrário, seu mel se derreteu diante de mim, e pensei ter visto ele dando uma leve espiada na minha boca também depois de dar um sorriso mínimo. Foi tão rápido que eu podia estar inventando tudo aquilo — o que era mais provável. Sentia-se a intensão numa linha imaginaria onde nosso olhar se encontrava. Não precisou de dois segundos para que eu começasse a tremer, e depois me perder, dentro do universo vasto de estrelas caramelizadas e bem guardadas de todo o restante do mundo que eram seus olhos.
Um pigarro desconfortável atrás de mim nos tirou do transe. Rafael pareceu querer desaparecer da entrada da sala, não sabendo onde colocar o olhar.
Sem planejar muito bem, me sentei, empurrando o peito de Justin como apoio. Ele soltou o ar com um pouco mais de força. Uma gemida rouca e inoportuna.
— Rafael... Bom dia — falei desajeitada, a sensação de estar sendo pega fazendo algo errado.
Não consegui me levantar, me enrolando nas pernas de Justin. Senti o olhar dos dois sobre mim. Não me ajudava com a coordenação motora.
— Desculpa, eu não queria... atrapalhar.
Justin finalmente resolver me ajudar, se sentou, depois estendeu uma mão de apoio para mim. Ele ficou muito perto de novo, e eu posso ter ficado mais lenta por isso. Assim, aceitei a oferta, passando a perna esquerda primeiro para o chão. O movimento despreparado me deixou quase sentada em seu colo, frente a frente com seu rosto amassado de sono.
Vai tomar no cu dessa beleza.
Tive a impressão de que ele queria rir da minha desordem. Quase chutei a cara dele quando passei a perna direita para o chão, me levantando como uma minhoca. Por pouco não parei de cara no chão até me firmar sobre os pés.
Dei um suspiro de esforço e voltei minha atenção para Rafael. Meu rosto pegando fogo.
— Já... usou o banheiro? Digo, para que eu possa ir também.... Que horas são?
A resposta veio de Justin.
— Sete horas — a voz grave e falha me deu arrepios.
Assenti, assumindo uma expressão responsável.
— Preciso ir ao banheiro, depois acordo Ryan e Caitlin e saímos.
— Pode deixar que eu os acordo — Justin sugeriu, pulando atrás de mim.
Passei por Rafael olhando para o chão, Justin me acompanhou pelo corredor. Antes de entrar novamente no quarto, não me impedi de dar uma boa olhada nele. Eu não sabia quando e se o veria naquele estado livre de boa parte de roupas de novo, tinha que aproveitar a oportunidade.
Previsivelmente, ele pegou meu olhar,
— Bom dia, Faith — me abriu um sorriso.
Sua expressão estava gradualmente mais leve do que do dia anterior, quase animado. Era compreensível, todo o peso de seus segredos havia saído de suas costas. Pelo menos a maioria deles.
— Bom dia — respondi embolado, sumindo de sua vista.
Pensei um pouco mais na escolha de roupas daquele dia, coisa que não fazia há um bom tempo — se não fosse para ocasiões especiais da galeria. O primeiro sinal de saudade do meu guarda roupa de Boston apareceu. Se comparadas, as roupas na minha frente não se passavam de trapos.
Numa tentativa rápida de arrumar o quarto para Rafael poder pelo menos entrar na noite passada, eu jogara tudo dentro da minha mala de novo. Agora, tínhamos peças amassadas das mais diversas formas. Tendo em vista a atividade que faríamos, não me restava muitas opções também.
Emburrada, levei uma calça skinny preta e a blusa amarela sem mangas, com babado na entrada dos braços, e um laço preto de fita fina para unir o tecido na parte superior das costas.
Quis tomar outro banho, permitindo que minha pele desfrutasse um pouco mais da sensação reconfortante da água escorrendo. Prendi o cabelo com um medo repentino de desgastar os fios. Enquanto isso, deixei minha mente vagar para a noite anterior no intuito de entender como havíamos parado enlaçados daquela forma.
Eu me lembrava dos assuntos serem conduzidos com cuidado para evitar qualquer comprometimento. Falamos sobre as melhores coisas em Minneapolis e as diferenças de Boston. Falamos sobre o espirito ranzinza da minha chefe e dos clientes que recebíamos. Falamos sobre a carreira de Caitlin — concordávamos que ela ainda faria muito sucesso — e o novo emprego, previsível, de Ryan. Falamos sobre o relacionamento repentino dos dois e como, no fim das contas, eram um casal bonitinho. Falamos sobre uma infinidade de assuntos banais, e em nenhum momento, sobre nós dois. Ele não perguntou do meu relacionamento com Rafael, e eu não mencionei Annelise. Me cocei para perguntar se ele havia me trocado por ela e em que ponto isso nos deixava agora. Mensurei quantas garotas haviam passado por sua vida — ou cama — enquanto ele estava longe. Quis saber se não sentira minha falta em algum momento, ou se não lhe perturbava mais me ver chorar. Tantas questões sacrificadas por uma conversa aparentemente civilizada que ambos parecíamos precisar. O tempo todo permanecemos distantes, pelo que minhas memorias entregavam. Eu estava furiosa com sua insensibilidade, mas, pensando na cena que me deparei ao acordar, nem isso era capaz de me manter longe.
Calcei um tênis preto segundos antes de sair do banheiro. Planejava seguir direto para a sala quando vi meu celular se iluminar no meio da cama.
Tive um estalo.
Caleb e Hanna!
Peguei o aparelho só para ver o monte de mensagens e ligações deixados por eles de novo.
“Você não está no apartamento. Já saiu para trabalhar?”
“A galeria ainda não abriu, estamos te esperando aqui na frente.”
Contive a vontade de jogar o celular na parede e dar um ataque de histeria. Se eles soubessem que apenas estavam me dando mais trabalho...
Fora do quarto, o cenário era quase cômico. Os quatro estavam vestidos, na sala, em extremidades diferentes, empenhados em não conversar. Achei estranho que eu fosse a pessoa que menos odiavam ali, geralmente era o contrário. Me senti uma espécie de cola ambulante quando todos me olharam parcialmente aliviados. Rafael não fazia parte do time, mas eu ainda teria a missão de unir os outros três.
— Deixei que você apresentasse sua proposta para os dois — Justin me disse com um quê de “boa sorte”.
Assenti e coloquei as mãos na cintura, a postura ereta de Mulher-Maravilha tanto para mim quanto para eles acreditarem na convicção de minhas palavras.
Pigarreei.
— Justin e eu... — não se atreva a sorrir por essa frase boba, Faith Evans — Justin e eu vamos conversar com Maya, depois, vamos para a empresa e eu vou entrar na sala de George — Ryan deixou escapar um murmúrio descrente — Caitlin e Ryan vão deixar Rafael na galeria e pegar Caleb e Hanna. Se quiserem, podem nos esperar aqui na cabana mesmo ou dar uma... — quase perdi a firmeza com as expressões intrigadas e furiosas na minha direção — volta pela cidade.
Ryan quase não me esperou terminar.
— Meu Deus, filha, o que você tem na cabeça?! Miolos que não são. Espera mesmo entrar na sala de George e me deixar de fora da festa?
Justin só levantou uma sobrancelha para mim, retificando tacitamente.
— Você acha que só seus planos são bons? Não tem essa de estar fora da festa. Vocês vão cuidar de Hanna e Caleb para mim.
— E como a Megamente espera entrar na sala de George?
— Do mesmo jeito que Justin faria. Ele me passa as técnicas e eu estarei lá. Dúvida da minha capacidade?
— Ninguém entra na sala de George sem ser convidado.
Demorou um pouco para cair minha ficha. Lancei um olhar violento para Justin.
— Você estava pensando em bater um papinho com George?
Ele inclinou a cabeça um pouco para o lado inocentemente, como se não houvesse mais alternativa.
— E você concordou com isso? — repreendi Ryan — Vocês são doentes ou o quê? Sorte que algum de nós pensa. Eu conversarei com George.
Tremi por dentro, apesar de falar com tanta eloquência. Não havia coragem em meu corpo, renovada ou não, que fosse capaz de apagar o “receio” que eu tinha daquele homem. George se portava como o dono do mundo, pegava o que queria, descartava o que não lhe era útil, simples assim.
— Nenhum de vocês pensam — Caitlin se manifestou antes de dar uma olhada rápida para um Rafael bem atento — Eu sou a única pessoa que George não odeia, tenho mais chances do que qualquer um aqui.
George não impediria que entrássemos, agora, sair era uma conversa bem diferente.
— Vai sonhando — Ryan e Justin falaram juntos.
Ficamos naquele impasse, nos entreolhando por segundos inteiros.
— Posso oferecer minha ajuda? — Rafael disse.
Fiz um breve sinal negativo com a cabeça, os outros o ignoraram.
— Meu plano está ótimo. Vamos de uma vez.
Eles não me deram crédito.
— Eu não vou ficar de babá.
Justin respirou fundo devagar e estalou os dedos.
— Ryan e Caitlin, para a galeria. Faith, vamos.
Não tive tempo de dar um sorriso presunçoso e surpreso por ele ter concordado comigo.
— Até porque da última vez que te demos ouvidos deu tudo certo — Caitlin ironizou.
— Tecnicamente, deu. Agora só preciso colocar o ponto final.
Para ele a ferida emocional não parecia ser tão relevante quanto a física. Então, sim, tecnicamente fomos bem-sucedidos. Tecnicamente deveríamos estar gratos por esses últimos meses sem sua presença. Tecnicamente, eu também podia esfolar seu rosto no asfalto quente do Rio de Janeiro.
— Da última vez vocês não quiseram ouvir minha opinião. — Olhei para cada um deles — Nenhum de vocês. E olha onde viemos parar. Agora, o problema é meu de novo, e a decisão também deveria ser, ao menos uma vez na vida, minha. Eu posso arcar com as minhas consequências. Mas não vou ser obrigada a lidar com a de vocês de novo.
Não me senti tão bem por jogar parte da culpa do inferno que passei nas costas de Ryan e Caitlin — apesar de não ter mentido em nada do que disse —, mas os resultados foram os que eu esperava.
Minutos depois, Justin me entregava uma sacola parda de rosquinhas e dois cafés. Foi sua ideia passar no Drive Thru para comprar café da manhã. Parecíamos uma espécie de dupla dinâmica para o crime, ou policiais locais dos filmes.
Ele me esperou estar com a boca cheia para falar.
— Você não está esperando que vai falar com Maya sozinha, certo?
Estava mesmo bom demais para ser verdade.
— Eu vou — respondi abafado através da rosquinha triturada, vagamente me lembrando de uma época em que eu levaria um tapa de Eleanor por isso.
Sua cabeça fez um sinal negativo.
— Eu vou junto. Ficarei quieto, prometo.
Olhei séria para ele. Mesmo sem me ver, ele sentia minha desaprovação. Então, já sabendo qual era minha preocupação, se inclinou sobre o câmbio e abriu o porta-luvas. Me encostei no banco o máximo que podia.
Justin tirou uma touca preta de lá e estendeu na frente dos meus olhos. Investiguei o tecido antes do som ser produzido no fundo da minha garganta. Não pude evitar, eu estava mesmo rindo. E, surpreendentemente, aquilo não me pareceu estranho como o era ultimamente.
Justin me olhou com receio.
— O que você está esperando fazer com isso? Assaltar um banco? — eu disse, rindo outra vez.
Ele estreitou os olhos.
— Como você espera que eu não seja reconhecido?
— Se pensasse em você disfarçado, imaginaria uma coisa mais Batman, com aquele modificador de voz e tudo.
— Dois chifres, uma capa e a cueca por cima da calça? Não, obrigado.
Só precisou de meio minuto para o carro explodir com nossas gargalhadas oriundas da projeção que fazíamos do seu figurino. Eu podia imaginá-lo perfeitamente vestido de Batman. O destaque que a máscara daria para sua boca não o deixaria tão patético afinal.
— Batman também é meio sombrio, você não pode discordar.
— Tudo bem, mas sejamos um pouco justos e arrumemos alguém para você ser também.
Não precisei pensar.
— A Mulher-Maravilha, com certeza.
Com o rabo de olho, ele me varreu de cima a baixo. Depois, tentou não sorrir.
— Concordo, mas não é o que eu chamaria de justiça. Não tem nada cômico em te imaginar com aquela roupa.
Disfarcei a satisfação particular redirecionando novamente a atenção.
— Você não ficaria tão ruim assim de Batman.
Sempre pensei que a voz do Batman interpretado por Christian Bale me dava certos arrepios. Justin não precisava ao menos engrossar um pouco ela.
— "Para controlar o medo você precisa se tornar o medo" — ele disse grave, recitando um dos personagens do filme.
— É isso o que estou dizendo.
Estacionamos em frente a casa de Maya conforme as instruções que eu dera. Da última vez que estive aqui, ela saíra para trabalhar bem depois das sete, e faltavam exatamente dez minutos para às oito. Eu queria descer e conferir o portão branco, mas Justin me fez mandar uma mensagem primeiro.
“Vamos conversar” Enviei.
Quase imediatamente, ela respondeu.
“Naquele mesmo pub. 18:30”
— Ela está na retaguarda. Seja pelo motivo que for. É oito ou oitenta. Pode ser extremamente inofensiva ou nociva. Mas se quer um lugar público, não deve estar planejando muitas coisas — Justin pensou alto — Mesmo assim, não gosto da ideia dela escolher o lugar e a hora. Com um intervalo tão grande de tempo, consegue adaptar o encontro da maneira que quiser.
— Mas, como você disse, não há problema por ser em um lugar público.
— É mais complicado. Só que dependendo do treinamento dela, não faz tanta diferença ter público ou não.
— Para você faz?
Alguma emoção passou por seus olhos.
— Não.
Eu tinha certeza de que Justin já havia se tornado o próprio medo há muito tempo. Me vi pensando em quantas pessoas ele feriu aos olhos de muita gente.
— Marque com ela no shopping, no mesmo lugar da última vez, hora do almoço.
Automaticamente, meus dedos já digitavam a mensagem, quando me toquei da tamanha familiaridade com que ele dissera aquilo.
— Última vez? — sondei sua expressão.
Aquele mesmo músculo de tensão saltou em seu maxilar.
— Como ficou sabendo?
Ryan podia simplesmente ter lhe dito, mas, somando isso ao fato deles terem trocado de veículo hoje, me gerava algumas dúvidas. Quando Ryan me pegou no shopping terça-feira com um porshe preto, eu havia pensado imediatamente em Justin. Claro, seu antigo veículo fora tomado pela Companhia, porém, ele podia ter assumido uma espécie de paixão pelo modelo a ponto de querer outro igual. E eu não tirava da cabeça aquela alucinação na praça de alimentação do menino com um balão em formato de avião passar na frente da minha visão.
Ele abriu a boca para responder. Reformulou o planejado, e tentou de novo, contrariado:
— Eu meio que... estava lá — alguma coisa em minha expressão fez com que continuasse falando — Ryan queria conversar com Annelise pessoalmente, perto do shopping, mas não podíamos te deixar sozinha, então eu fiquei te vigiando para o caso de ocorrer algum problema. Acabei me descuidando e você me viu... então tive que sumir, e quando te procurei de novo, estava com problemas com Maya. Me segurei para não intervir enquanto chamava Ryan, mas se ela chegasse um pouco mais perto... Só que você conseguiu se virar sozinha. Dei as chaves para Ryan e o resto você sabe. Voltei para conferir que seu amigo ficaria bem, e depois ela sumiu, caso contrário, a cabeça dela seria encontrada do outro lado da cidade.
Parei os trilhos dos meus pensamentos quando vi que estava prestes a me culpar por não vê-lo antes. Se eu não tivesse me defendido, ele entraria em cena.... A culpa era apenas dele. A escolha era dele. Eu não podia fazer isso comigo mesma. Justin escolheu me deixar. Me perguntei se ele viu a desolação arder em meu rosto quando ele sumiu atrás do balão e se sentiu alguma empatia com isso. Provavelmente não, para a segunda sentença.
Olhei pela janela, o queixo duro.
— Por que não podemos invadir? — apontei para a casa.
Ele demorou um pouco para aceitar a mudança brusca de assunto.
— Hm, não sabemos como é o perímetro.
— Podemos estudá-lo agora.
— Não sabemos o que há lá dentro.
Me voltei para ele.
— Sinceramente, isso já foi capaz de te impedir antes?
Ele estava na defensiva.
— Não, mas não vou arriscar sua segurança.
Revirei os olhos.
— Podemos resolver o problema com o contrato agora, Maya não é uma prioridade. Você pode conversar com ela no almoço, não há pressa.
Não respondi, fingindo estar interessada numa senhora com roupa esportiva laranja florescente caminhando com um labrador esbaforido. Ele lutava a todo custo contra a coleira para correr em liberdade. Me identifiquei com ele de tal modo que quase desci do carro e o libertei das mãos frágeis da senhora.
— Faith, por favor.
Não olhei para sua cara impecável de persuasão, já era o bastante ouvir sua voz melodiosamente doce pronunciar meu nome daquela maneira para me convencer.
— Você ao menos planeja me deixar entrar na sala de George?
Houve uma pausa.
— Você tem que ouvir meu ponto de vista...
Abri a porta do carro, jogando minhas pernas para fora. Eu não sabia se teria coragem de fazê-lo se não soubesse que ele viria atrás de mim, mas no momento, não me importava. Toda a questão se resumia a mim, e eu o faria entender isso por bem ou por mal.
— Faith... — ele chamou logo após abrir a porta.
Não cheguei a dar um passo e o zumbido do portão de Maya ganhou vida. Antes que o portão pudesse se mexer mais de dois centímetros, as mãos de Justin agarraram meus braços. Em um segundo, eu estava batendo as costas contra a lataria do carro, Justin armava um cerco protetor a minha volta, os olhos tensos fixos nos meus. Não respiramos.
— J, você conhece uma coisa chamada celular ou está muito ocupado acrescentando mais um nome no seu livro de conquistas?
Nos viramos para a Annelise bem-humorada dentro da propriedade de Maya, seu sorriso cínico de um gloss melequento chegava a brilhar no sol para apresentar a façanha de ter invadido antes de nós. Ela deitou a cabeleira loura para ver atrás de Justin, me localizando, mas eu duvidava que não houvesse me visto antes.
— Ah, oi, Evans.