Leitoras com Swag

Hey garotas, beliebers ou não beliebers. Só estava faltando você aqui! Nesse blog, eu, Isabelle, faço IMAGINE BELIEBERS/ FANFICS. Desde o começo venho avisar que não terá partes hots nas Fics, em nenhuma. Repito, eu faço 'Imagine Belieber' não Imagine belieber Hot. A opinião da autora - Eu, Isabelle - não será mudada. Ficarei grata se vocês conversarem comigo e todas são bem vindas aqui no blog. Deixem o twitter pra eu poder seguir vocês e mais. Aqui a retardatice e a loucura é comum, então não liguem. Entrem e façam a festa.
" O amor não vem de beijos quentes. Nem de amassos apertados. Ele vem das pequenas e carinhosas atitudes."- Deixa Acontecer Naturalmente Facebook.
Lembrem-se disso. Boa leitura :)

Com amor, Isabelle.

quinta-feira, 8 de outubro de 2020

One Time 15

— O quê? — Gaguejei em choque. Eu tinha ouvido tudo o que ele dissera, ou o que eu pensava que dissera, mas não conseguia assimilar as palavras. Não parecia verdade, não batia com o que eu havia me preparado durante o dia inteiro, praticamente por semanas. 

Mas ainda que grande parte de mim rejeitasse a realidade do momento, parte significante já se deslumbrava com a possibilidade. Deslumbrar parecia uma palavra muito amena, a bem da verdade, e eu não acho que exista uma palavra que abarque toda a emoção que viajava por meu corpo. 

Justin franziu o cenho de concentração, carregando o semblante de seriedade e intensidade. 

— Case-se comigo, Faith Evans. Eu só tenho uma vida e eu quero vivê-la com você. Você é meu único amor, minha prioridade. Essa é a única vez que direi isso a alguém: meu coração é seu, para sempre. 

Eu não percebi que havia perdido a força nas pernas até me ver de joelhos na frente dele, desmoronando por dentro e por fora. 

— Eu pensei... eu pensei que você havia desistido... que você não queria... — balbuciei com voz fraca, suas palavras começavam a perfurar a névoa confusa em minha mente. 

Olhei para suas mãos, onde estava a caixinha de veludo vermelha aninhando uma aliança prata incrustada com pedras preciosas azuis que se entrelaçavam em toda a sua extensão, no centro tomava a frente uma pedra de diamante que se projetava num desenho rebuscado como uma margarida, e representando o miolo, mais uma pedra preciosa azul clara. Arfei, era a joia mais linda que eu já havia visto na vida, e eu nunca fora muito de me importar com isso. 

— Você ainda não entendeu, Faith? — Olhei pra ele de volta, atordoada. Sua mão livre se estendeu para o meu rosto, acariciando-o e espalhando a umidade que só podia ter transbordado dos meus olhos — Eu sempre vou querer você. Desculpa por te fazer pensar o contrário.

— Então você não vai terminar comigo? — Sussurrei, trêmula. 

Um meio sorriso esticou seus lábios.

— Eu nunca poderia. Esperava que você fizesse isso. 

Neguei com veemência, meu primeiro gesto enfático desde que entrara em seu carro. 

— Eu não posso existir sem você — um calafrio de sinceridade me percorreu.

Seu rosto todo se contorceu, atravessado profundamente com algo parecido com dor. 

— Vai se casar comigo? — Perguntou de novo. 

Eu não sabia de onde viera, mas uma risadinha histérica escapou dos meus lábios. Aquelas palavras me atingiam mais do que qualquer coisa, carregavam um significado eterno, um compromisso divino e terreno, sinal de puro pertencimento e redenção. Tudo o que eu mais desejara era me entregar a ele, com absoluta confiança e por inteiro. Abusando de todos os clichês, acredito com tudo o que eu sou que fui feita para ele e ele foi feito para mim. E nada mais parecia certo se não estivéssemos juntos. 

Estremeci com a força daquela verdade reverberando em meu corpo e me atirei contra ele, encontrando em sua solidez meu lugar no mundo, em seus braços me sinto imbatível, imortal e atemporal. Eu não precisaria de mais nada se estivesse ali para todo o sempre, podia sentir a benção de Deus nos envelopando naquela bolha, eu O havia invocado para se fazer presente naquela relação, e assim eu poderia literalmente enfrentar qualquer coisa. Meu corpo e mente sentiam-se tão dispostos a ponto de empurrar montanhas e derrubar prédios, e não mais ser esmagada por eles. 

Justin se deixou cair no chão com o impacto, mas o movimento foi muito controlado para que eu pensasse ter sido só obra minha. Suas pernas envolveram as minhas e os braços as minhas costas. 

— Você ainda precisa perguntar?! — Respirei profundamente o aroma de seu pescoço, minha fragrância preferida, e me afastei para poder olhar em seus olhos que agora sorriam — É claro que eu quero me casar com você, seu idiota. E só seremos separados quando formos chamados por Deus, estou te avisando! — Minha voz vibrava tanto que era irreconhecível a meus próprios ouvidos, como sinos batendo sem cessar. 

— É tudo o que eu quero — um sorriso enorme rasgou seu rosto e eu pensei que minhas lágrimas estavam caindo em seus próprios olhos ao vê-los umedecerem. O fluxo em meu rosto se tornara constante, mas minhas glândulas lacrimais não poderiam ser responsáveis pela vermelhidão ao redor de seus olhos. 

Fiquei perplexa ao observar uma gotícula de água se formar sobre seus cílios inferiores. Justin nunca chorava, resultado de sua criação rígida, então meu espanto era justificado. Eu não parecia mais estar ligada a terra ou ao meu próprio corpo, e a sensação foi reforçada quando ele alcançou meus lábios num átimo, dando-me um beijo de ternura vigoroso, diferente de qualquer um que já havíamos experimentado juntos. Nosso contato ia além de qualquer sensação física, mesmo que se temperasse dela. Estávamos pintando juntos, criando nosso próprio tempo e espaço ali no mundo eterno e singular. Ele se afastou cedo demais para sorrir pra mim. 

— Posso colocar a aliança em seu dedo? 

Eu me ajeitei sobre os joelhos imediatamente, feito uma criança ansiosa para receber seu presente de natal. Ele deu uma risadinha de júbilo, movendo-se com muito mais elegância do que eu. Tirou a aliança da caixinha com a mão direita sob meus olhos deslumbrados e a estendeu para mim. Sem capacidade de pensar em qual mão se usava uma aliança de noivado, abri as duas na sua frente, meus dedos tremiam como se eu estivesse passando mal. Ele riu de novo antes de escolher o dedo anelar da mão direita. O metal deslizou por ele até se encaixar com perfeição, aquele parecera sempre ter sido seu lugar, como se eu não fosse completa antes. Meu coração explodiu de regozijo. 

Justin interrompeu o momento colocando na palma da mesma mão outra aliança prata, essa bem simples, e me estendeu seu dedo anelar direito. Eu sorri para ele antes de imitá-lo. Depois, coloquei minha mão sobre a sua, analisando-as juntas.

— Você gostou? — Ele perguntou distraidamente, a emoção tão bem controlada na voz saltava em seu rosto.

— São lindas — e então o fitei, encontrando em sua íris um reflexo da minha própria comoção, estávamos em harmonia. 

— É uma promessa, Faith. Até meu coração parar de bater. 

Um nó se estreitou em minha garganta, embora eu ainda não houvesse parado de chorar. Levei as mãos ao redor de seu pescoço, como se pudesse fazê-lo cumprir a força. 

— É só o que eu peço — falei baixinho — Nunca mais me deixe, nunca mais se afaste de mim, por favor. 

Ele colocou a caixinha no chão e segurou minha cintura, me puxando mais para perto. Colocou minhas pernas em cima das suas, de forma que pudéssemos ficar apenas a alguns centímetros de distância. O nariz quase tocava o meu quando ele respondeu, concentrando toda sua atenção em mim. 

— Eu senti vergonha de mim mesmo por não ser quem você merece. E a coisa mais importante para mim no mundo inteiro é sua felicidade. Não estava conseguindo uma forma de mudar essa vida que tanto te faz infeliz, então pensei que seria melhor se me afastasse de uma vez. Mas todas essas distâncias me doeram e eu pensei o tempo todo em você — ele tocou meus fios de cabelo delicadamente, colocando-os atrás da orelha — E me vi pensando em alternativas que ao menos te protegessem e... então lá estava você pedindo o tempo todo para ser incluída em tudo. Como se não tivesse medo de nada — ele sorriu quase com repreensão, levando os dedos para o meu queixo — E eu pensei que, bem, é verdade que se você fosse minha esposa — a palavra fez seus olhos brilharem e eu senti um aperto agradável no peito — seria mais fácil ainda. Você já tem um alvo nas costas, sempre vão tentar te usar para me atingir — ele disse aquilo como um pedido de desculpas — e ninguém poderá ignorar as consequências de enfrentar uma Bieber. 

Eu não pensei em todas as implicações de ter aquele sobrenome, eu só conseguia me focar na parte de ter o mesmo sobrenome que o dele, e nunca imaginei que existisse felicidade maior que aquela.

Ele beijou minha testa repentinamente e então ficou mais sério. 

— É claro que nossos treinamentos serão mais afincos agora. Eu vou dar minha vida por você, mas sei que não sou onipresente, então preciso que você saiba um pouco mais de defesa.

Projetei um beicinho. 

— Então tudo se trata de uma estratégia, hein? 

Seus traços relaxaram novamente. 

— Minha maior estratégia é ter você para mim, Faith. Eu enumerei todos os motivos para ser egoísta a esse ponto, mas a maior verdade é essa — ele apontou com o queixo para trás e eu olhei o quadro que pintara com tanta perfeição — Você é tudo o que eu penso, desde o primeiro dia em que coloquei os olhos em você naquela festa em Boston, descendo aquelas escadas com o vestido vermelho e me roubando de mim mesmo. Preciso te ter de todas as formas humanamente possíveis. 

Minhas bochechas ruborizaram de imenso prazer e eu acariciei seu cabelo. O primeiro dia em que o vira parecia ter acontecido a uma era atrás, mas eu ainda o acho estupidamente perfeito. Com uma intensidade maior agora, de fato.

— Você deveria me deixar te mostrar tudo o que enxergo em você, tanto de quem você é hoje quanto quem pode se tornar. Eu acredito em você, Justin. E não me importo nada de lutar com você, contra o que for. Mesmo que seja contra você mesmo. Que tal me deixar decidir onde e com quem quero estar? — peguei a ponta do seu nariz e o apertei como punição. Ele fez uma careta enquanto ria do meu castigo. Depois, segurei seu rosto com as duas mãos, obrigando-o a prestar muita atenção — Se você tentar me afastar de você de novo, e nós dois sabemos que essa é a segunda vez que faz isso, eu juro que te dou uma surra que vai deixar os assassinos no chinelo. Ouviu bem?

Claramente ele achou muita graça do que eu disse, mas assentiu solenemente. 

— Temos um acordo — mas traços sombrios permearam seu rosto — E você tem certeza que quer saber de tudo? Que me aceita assim? E está disposta a encarar meus defeitos e as frustrações da minha jornada?

Revirei os olhos para a incerteza. 

— Para onde mais eu iria, J? — beijei seus lábios com uma leve pressão, depois acariciei sua bochecha macia — Eu quero você, com tudo o que isso significa. 

Funcionou, seu rosto estava novamente tomado daquela expressão sublime. 

— Você é mesmo meu anjo descido diretamente do Céu.

— Eu te amo — concluí simplesmente e o ataquei de novo. 

Entrelacei-me a ele de todas as maneiras possíveis, para que não houvesse distância alguma entre nós. Toda a agonia de não poder mais estar com ele agora fazia parte do passado e o alívio que isso gerava era quase tão arrebatador quanto pensar que eu me tornaria sua esposa. 

Sua esposa. Só de pensar na palavra eu sentia um tremor de alegria. Eu funguei e limpei meu rosto antes de beijá-lo até que precisássemos mesmo de um tempo para respirar, e mesmo assim, distribuí beijinhos por seu rosto, seu pescoço, cabeça... Ele quase ronronava de contentamento. 

— Então.... eu estava pensando em datas — começou ainda ofegante, os dedos trilhando um caminho feliz por minhas costas. 

Interrompi por um segundo o que fazia. Claro, estar noiva — ai meu Deus — significava casar. E para casar precisávamos de uma data. Preparativos. Anúncios. Tantas providências!!! Hanna se divertiria muito com todas elas, bem como Eleanor. Meu pai talvez enfartaria com Caleb ao descobrirem que eu escolhera Justin para o resto da vida mesmo.

— Você já pensou em uma? — Perguntei, voltando com a linha de beijos. 

Quanto tempo um noivado normalmente durava? Um ano e meio? Um ano? Será que até lá já teríamos resolvido toda a questão com a família Bieber e Cavanagh? Ou precisaria ser um noivado maior até resolvermos tudo? 

— Hmm... O que acha daqui a um mês, no máximo?

Eu me afastei para olhá-lo diretamente, os olhos arregalados. 

— Você precisa de mais tempo para se acostumar com a ideia? Para pensar melhor? — Seus olhos se apertaram um pouquinho hesitantes.

Respirei.

— Não preciso pensar melhor em nada, tenho certeza do que eu quero. 

Ele deu um sorrisinho.

— Faith, se eu pudesse me casaria com você amanhã, tenho pressa em todos os sentidos do termo — suas mãos pressionaram com um pouco mais de força minha cintura, causando um arrepio por todo o meu corpo.

Virei um pimentão. 

— Hã... Você quer dizer que... 

Ele entendeu o que eu havia pensado e riu. 

— Não quero apressar as coisas porque quero ter seu corpo de uma vez por todas. Não apenas — eu escondi o rosto em seu peito, envergonhada. Se eu fosse pensar nessa linha, também queria que fosse o mais rápido possível.... — Apenas penso que não há motivos para adiar, pelo contrário — sua respiração soprava em meu cabelo, ele apoiou o queixo no topo da minha cabeça. 

Fiz desenhos circulares em seu pescoço, sem querer citar o que eu estava pensando para não estragar o momento. Se eu pensasse na ideia de estar casada com ele em um mês, não sentia medo, apenas júbilo, um nervosismo justificável e ansiedade. Mas... 

— Você não acha que podemos... ter problemas? Com certas pessoas? De situações não resolvidas? — murmurei. 

Ele suspirou, os braços me apertaram com mais firmeza de novo, mas dessa vez como se pudesse me proteger de tudo.

— Não acho que devemos esperar tudo se resolver para tomar esse passo. Na verdade, essa incerteza é uma das motivações a favor de ser o mais rápido possível. É melhor para te proteger e... — ele lutou para achar as palavras adequadas e eu esperei — não quero correr o risco de perder isso. De acabar não realizando tudo o que eu queria.

Eu me encolhi ao entender o teor de suas palavras. Estávamos envolvidos em questões muito perigosas para sermos presunçosos o bastante em pensar que não havia chances de perder. Justin sempre fora muito confiante com seus planos, e sua falta de confiança me deixava mais nervosa. Era muito arriscado. E eu não sabia mais se valia a pena. Não queria colocar sua vida em risco por um capricho meu.

— Talvez seja melhor pararmos com isso então. Parar de mexer no cacho de abelha — sussurrei. Imaginar o que podia acontecer com ele por isso fez a cor sumir imediatamente do meu rosto, meus músculos perderam a força.

Justin beijou meus cabelos. 

— Não acho que seja possível, Faith. Eles nunca vão confiar em mim, é uma questão de tempo para um impasse — eu estremeci e então ele mudou o tom da conversa — Mas não fique pensando nessas coisas, o que importa somos nós dois. Tirando essa questão, você acha que é muito cedo? Não estamos prontos? 

Me obriguei a descartar os fantasmas de minhas preocupações, isolando-os para lidar com eles depois. Uni as mãos em seu peito e descansei o queixo nelas, olhando para seus olhos de mel, tão lindos, tão meus. 

— Eu nunca vou querer mais ninguém — falei convicta — Por mim, poderíamos nos casar agora. Mas... e você? Realmente acha que estamos prontos? Tem certeza... de mim? Você sabe que eu considero o casamento eterno mesmo. 

Um vinco surgiu em sua testa. 

— Eu vou ter que me esforçar muito para te provar que nunca mais houve nem haverá mais ninguém? Se você desacredita das minhas palavras, minhas atitudes provarão cada vez mais a partir de agora que eu sou completamente seu — a ponta dos seus dedos acompanhou o desenho das minhas sobrancelhas e então abriu um sorriso arrasador como se eu já não estivesse fraca o bastante — Casamento para daqui a um mês então? Se conseguirmos, até antes? Quero um casamento digno, com festa e tudo o que temos direito. 

Assenti, o estômago se embrulhando com a ansiedade agradável. 

— Sim, de acordo. Bom, só tem uma coisa.... 

— Seus pais — adivinhou — Vou conversar com eles no jantar de quinta.

O nó nas tripas daquela vez foi de medo da reação deles. Eu não voltaria atrás, mas também gostaria que eles viessem para o casamento.

Casamento. 

— Que bom que você sabe defesa pessoal. Eles vão te matar, provavelmente. 

Justin pareceu achar a ideia muito empolgante. 

— Não tem problema, a única coisa que tenho medo é de perder você — seus dedos deslizaram por baixo do meu cabelo, em minha nuca. Os arrepios me assaltaram de imediato. 

Eu sorri toda besta. 

— Que bom — e então me lembrei sobre outra coisa do jantar de quinta e fiz uma leve careta — Ah... tenho uma coisa a dizer. 

De imediato ele ficou desconfiado, contraindo os lábios. 

— O quê? Voltou a perseguir o Roger? Invadiu a casa do oficial Somers? 

Lhe mostrei a língua. 

— Não. É que... — desviei os olhos do rosto dele, voltando a desenhar em seu peito e vistoriando meus movimentos como se pintasse um quadro muito importante — eu acabei convidando algumas pessoas para o jantar de quinta, no calor do momento — era melhor já falar de Rafael também. 

— Hmm.... Quem são? — Perguntou hesitante, provavelmente imaginava possíveis convidados que não lhe seriam agradáveis, pela minha dificuldade em anunciar o fato. 

— Bom... só o Rafael... — olhei novamente seus olhos para avaliar suas reações, não houve nem uma centelha de emoção, enigmático — e o Wren com a namorada — confessei de uma vez. 

Foi uma careta praticamente espontânea a que surgiu no rosto dele. Mordi a boca, vendo a irritação faiscar do seu olhar, embora deva admitir que ele de fato estava se esforçando para contê-la. Eu esperei que me repreendesse, enquanto me fitava, mas a linha em sua boca ficava cada vez mais rígida, como alguém muito empenhado em não vomitar. 

A espera só foi me deixando cada vez mais tensa e estava prestes a chacoalhar seus ombros e implorar que dissesse qualquer coisa quando ele respirou fundo, a serenidade sendo socada a força em suas linhas. 

— Wren... Sim, fiquei sabendo que voltaram a conversar — a voz estava muito controlada, mas não se preocupou em esconder totalmente a acusação.

Estreitei os olhos. 

— Eu te contaria, mas você estava muito ocupado me evitando — devolvi. 

Ele deu um sorrisinho duro por uma fração de segundos. 

— Você sabe o que penso dele, certo? 

— E você sabe que ele é meu amigo de infância, certo?

— Eu sei? — Arqueou a sobrancelha. 

— Nós sabemos. Ele é inocente — bati o pé, em sentido figurado. 

Justin sondou meu rosto, mas me mantive muito firme, acompanhando o movimento do seu peito conforme respirava. Ele balançou a cabeça levemente. 

— Não sei como a sua inocência não te matou ainda, Faith — eu esperava que sua voz soasse mais cortante. Estava até que suportável. 

Revirei os olhos, esperando mais um pouco de bronca, uma negativa, um discurso sobre o que os pais dele fizeram, qualquer coisa. Fui surpreendida quando sua mão acariciou minha bochecha e a expressão ficou ainda mais leve, quase livre do estresse.

Empertiguei os ombros, eu não queria incentiva-lo, mas fiquei chocada demais para ficar quieta: 

— Só isso? Não vai dizer que ele não pode vir? Que eu não deveria ter voltado a falar com ele? 

Seu sorrisinho presunçoso terminou de extinguir qualquer traço de desavença. 

— Ah, não vou deixar ninguém atrapalhar um momento como esse, eu acabei de te pedir em casamento e você aceitou — deu de ombros, o movimento indiferente não combinava com a exultação visível em todas as suas linhas de expressão — Posso lidar com Wren depois, acho que ele precisa mesmo renovar suas opiniões pessoalmente sobre mim, se se atreveu a voltar a falar com você. 

Dei um tapinha em seu peito apesar de sentir os cantos da boca se erguerem num sorriso pela primeira frase. 

— Seja bonzinho — repousei a mão direita em seu rosto e mesmo que não houvesse me esquecido da aliança, fiquei radiante ao vê-la ali em contraste com sua pele de porcelana. Demoraria a me acostumar com ela, sabia disso, e me agradava por ser assim. Meu coração transbordava ao vê-la em meu dedo. 

Não tinha a ver com o fato de ser uma joia linda, das que Eleanor daria um dedo para obter, era o que ela representava. Que ele me queria pra sempre, que seríamos um só diante dos olhos de todo o mundo. Bem no fundo da minha mente, recordei-me de um porão na mansão dos Biebers em Boston, quando resolvi me entregar pensando que resolveria todos os problemas da vida, o carrasco que fora designado a me torturar estivera prestes a arrancar meu anelar direito "para que Justin pulasse a aliança de compromisso e fosse direto ao casamento". 

Estremeci com a lembrança e fiquei ainda mais grata ao ver o dedo ali, lindo com o objeto de devoção do meu.... noivo.

Estremeci outra vez, agora de felicidade. 

— Você está com frio? — Justin passou a mão em minhas costas repetidas vezes, preocupado em me aquecer. 

Neguei e abri um sorrisinho. 

— Ah não, mas tenho outras ideias se você quiser mesmo me aquecer. 

Manifestamos ternura antes que ele puxasse meu rosto para me dar outro beijo tão bom quanto o primeiro, talvez até melhor. Movemos nossos lábios com sincronia e eu me ajeitei sobre ele, tentando não machucá-lo com meus cotovelos e não esmagá-lo com meu peso. Justin não estava tão preocupado assim consigo mesmo, ao passo que me puxava mais de encontro a si pela cintura, a outra mão se entrelaçou em meu cabelo, fixando-me sobre sua boca. Sorrateira, sua língua deslizou entre meus lábios receptivos e dançou com habilidade com a minha, movimentos que deixariam bailarinos profissionais invejosos. 

Sua mão se desenroscou do meu cabelo e desceu decidida pelo meu tronco até encontrar minha coxa e puxá-la para cima, apertando-a com firmeza. Arquejei, motivada pelo movimento inesperado. Aproveitando minha surpresa, sua boca desenhou uma trilha em minha mandíbula até se enterrar em minha orelha. Ao mesmo tempo, sua mão esquerda imitou o movimento anterior com a outra coxa e eu derreti sobre ele. Meus cabelos caíam sobre seu rosto como um leque, tornando sua respiração muito concentrada no pé do meu ouvido, e a minha assumiu uma velocidade vergonhosa quando ele temperou sua sessão de tortura com lambidas e mordidas sutis em minha orelha. Eu me contorci, o corpo inteiro desejando aderir uma parte dele. De repente nossas roupas pareciam extremamente inadequadas, muito quentes para a estação, sobretudos de pele no meio do deserto.

E então ele estava me beijando de novo, desfazendo minha linha de raciocínio. Tanto que eu mal percebi a mudança na gravidade, de algum modo eu estava na vertical de novo e ele nos impulsionou para cima, tudo sem a mínima necessidade de ajuda da minha parte. Abri os olhos surpresa ao notar que ele estava em pé, me carregando como a um coala. 

— O que está fazendo? — Perguntei, a voz ridiculamente falha.

Ele pressionou os lábios mais uma vez contra os meus e eu me esqueci que estava esperando uma resposta até que se afastasse de novo e respondesse pretensioso. 

— Mantendo seus votos. Não nadamos até aqui para morrer na praia. E eu estava quase convencido a morrer. 

As palavras enigmáticas fizeram sentido apesar da minha confusão mental devido a sua expressão quase vulgar. Meu coração disparou repentinamente. 

— Tem razão — concordei envergonhada, embora quisesse gritar "VAMOS MORRER DE UMA VEZ". 

— Vou te alimentar e depois podemos ir lá em casa dar as boas novas. O que acha? 

Apertei meus braços ao redor de seu pescoço, completamente feliz. Qualquer ideia que envolvesse estar junto dele me faria bem. E anunciar a novidade a nossa família tornava tudo mais emocionante ainda.

— Uma ótima ideia. 

Apesar das suas palavras, quando chegamos às escadas ele começou a subir para o último andar. Bem... A menos que... Hm, o que ele considerava me alimentar? Justin viu a confusão no meu rosto e se divertiu muito com ela. Eu ainda não havia achado uma forma de perguntar quando ele parou em frente ao seu quarto, o que me deixou ligeiramente mais tensa. Suas sobrancelhas se arquearam para mim e ele empurrou a porta com a ponta do pé. Arfei assim que pude ter uma visão ampla do cômodo. 

Pequenas velas redondas vermelhas aromáticas estavam espalhadas por todas as superfícies, criando uma iluminação mais rústica e romântica. Em cima do seu tapete grosso e creme estavam dois aparelhos de fondue em pleno funcionamento, misturando-se ao aroma das velas, chocolate e queijo, além de frutas, carnes e vegetais. Meu estômago se remexeu inquieto de fome. Para completar, uma garrafa de champanhe com duas taças de cristal em volta e pétalas de rosa distribuídas aleatoriamente por toda a cena. 

— Justin! — Engasguei. 

Eu não duvidava de sua capacidade romântica e de surpreender, mas, ele havia mesmo se superado. 

— Eu não sei o que faria com tudo isso se você dissesse não — franziu a testa com preocupação fajuta.

— Por isso você fez em um quarto diferente? Para que eu não me sentisse pressionada?

Ele me desceu do seu colo, risonho. 

— Era lá que eu estava pintando seu quadro também. Podemos? 

Agarrei sua mão e me apressei para nos unirmos àquele conto de fadas. Para quem não queria que eu morresse na praia, ele me apresentara um Titanic e tanto. Tirei o calçado antes de pisar no tapete enquanto ele tirava o casaco para jogá-lo negligentemente sobre sua cama. O movimento fez com que seu perfume viajasse pelo ar agradavelmente quente a minha volta e eu dei um suspiro profundo para extrair o máximo do aroma. O imitei com o casaco, apreciando a visão dele puxando as mangas da camisa social cinza até os cotovelos — um coisa incrivelmente tentadora de presenciar —. Fiquei encarando a criatura totalmente impecável, chocada e lisonjeada com o fato dele me querer. 

Ao captar meu olhar, piscou pra mim e me deu um selinho. Eu fiquei inclinada para o ar quando ele se afastou antes que eu estivesse satisfeita — se é que algum dia poderia estar —, provocando-lhe outra risada gutural. Estávamos cheios de sorrisos e risadas naquela noite, uma das mais felizes que já havíamos vivido sem dúvidas. Sentamo-nos lado a lado em frente aos aparelhos e Justin colocou um prato branco na frente de cada um. Depois espetou um pedaço de frango e mergulhou no queijo. Assim que estendeu o alimento na minha direção, o abocanhei, gemendo de contentamento. O sabor impecável e quente foi muito bem vindo na minha língua. 

— Ficou bom? — Justin confirmou. 

Uni as pontas dos dedos e encostei nos meus próprios lábios, afastando-os abertos em seguida como se explodissem, sinalizando o quão magnífico estava.

— É óbvio que você puxou pra sua mãe — completei depois que terminei de mastigar. 

Suas covinhas apareceram. Peguei o outro espeto para retribuir a gentileza enquanto ele enchia nossas taças com champanhe. E logo depois de comer a carne que eu espetara para ele, entrelaçamos os braços para tomar um gole do líquido juntos, feito um ensaio para o dia do casamento. 

Casamento. 

Os olhos dele faiscavam a meia luz, tão intensos e expressivos como eu nunca vira antes, eu podia enxergá-lo novamente sem máscaras, completamente exposto e receptivo a mim. Sua alma reluzia dos sentimentos mais puros e leves, e saber que aquelas sensações eram provocadas por mim, me fazia mais bem do que minha própria felicidade. 

Passamos a refeição inteira alimentando um ao outro e esgotamos juntos a garrafa de champanhe. Justin fez menção de se levantar para pegar outra no frigobar, mas eu não estava pronta para deixá-lo se distanciar por milímetros que fossem. Partimos para o doce e um fio de chocolate escorregou do morango para o meu queixo

— Não se preocupe com isso — Justin me parou quando eu me inclinei para pegar o guardanapo.

Em seguida seus lábios estavam na área suja. Eu quase engasguei ao tentar engolir rápido a fruta em minha boca, transformando a pequena carícia em um beijo lento, daqueles que desnorteia os sentidos e te faz perder o ar em poucos segundos. Por mais que o fondue salgado estivesse realmente saboroso, minha parte preferida foi o doce, dividimos algumas frutas, repartindo-as ao mesmo tempo com nossos lábios juntinhos e recebi muito beijos por todo o meu rosto, pescoço e alguns na clavícula. Como não sou egoísta, retribuí com muita boa vontade os carinhos, e em poucos momentos estávamos deitados em seu tapete macio. 

— Onde você quer realizar o casamento? Aqui? Paris? Dubai? Veneza? Rio de Janeiro? — Seus dedos subiram e desceram por meu braço ao passo que eu repousava metade do corpo em cima do seu.

Eu fiquei muda de início pelas possibilidades e o fitei. Ele sorriu. 

— Vou te levar aonde quiser, podemos pagar as passagens e estadia dos convidados que não puderem arcar com as despesas. Ou simplesmente de todos os convidados. 

— Bryan não te deixaria pagar tudo — retruquei ainda sem saber o que dizer sobre o lugar. 

Ele deu de ombros.

— Não me importo. Se ele quiser ajudar tudo bem, mas não vou contar com isso. Não será um problema se ele não ajudar. Para onde quer ir, Faith? E a lua de mel? Diga e você terá. 

Eu abri a boca várias vezes para dizer alguma coisa, mas só conseguia pensar em uma frase:

— Você é um sonho, Justin — passei a perna ao redor de sua cintura e envolvi a lateral de seu pescoço com uma mão — Me prometa que eu nunca vou acordar. 

Seu indicador tocou a ponta do meu nariz, depois fez o contorno da minha boca distraidamente. 

— Eu sou seu, Faith, pesadelo ou não — falou baixinho, o hálito quente soprando em meu rosto. 

Por instinto me aproximei mais. 

— Meu único pesadelo é ficar sem você. 

Uma pausa agradável para mais um beijo apaixonado e eu nem me lembrava mais a sensação de ter ossos firmes dentro do corpo.

— Decidiu o lugar? — Insistiu, respirando em meu pescoço. 

Como ele podia esperar que eu tivesse qualquer pensamento lógico naquele momento? 

— Hmm... Te respondo amanhã? Para onde você quer ir? — eu esquecia cada palavra que havia pronunciado logo após proferi-las, então não sabia se ele acharia coerência nelas.

— Para onde você estiver — mordiscou meu pescoço e então deu uma risadinha quando me arrepiei inteira — Vamos contar para os outros de uma vez? Você está mesmo irresistível essa noite, mais do que o normal. 

Refiz mentalmente minhas escolhas de beleza naquele dia e tive certeza de que não havia nada inovador. Na verdade, meu desânimo me deixara mais desleixada com a aparência. Se não falava apenas para me agradar, devia estar embriagado por nosso contentamento.

— São seus olhos. Vamos. 

Mas nenhum de nós se mexeu. Quer dizer, não para ir embora. Sua mão puxou meu queixo de modo que iniciássemos mais um beijo. Só depois de estarmos completamente sem fôlego ele se afastou, acariciou minha bochecha e beijou minha testa. Por mim eu ficaria lhe encarando pelo resto da noite, mas, sendo mais forte do que eu — em todos os sentidos — ele tomou impulso, puxou minhas pernas para o seu colo e levantou-se me segurando como se fosse me ninar. Eu ofeguei de surpresa, mas mal me acostumara com a posição e meus pés já estavam no chão. Ele claramente estava satisfeito pelo meu choque momentâneo.

— Me ajuda a levar as coisas para baixo? 

— Sim, claro. 

Justin equilibrou os pratos, a garrafa de champanhe e um dos aparelhos sozinho, me pedindo para lidar apenas com um aparelho e as duas taças. Eu coloquei as taças embaixo do braço e tentei segurar o aparelho sem derramar nada no chão. Quatro lances de escada depois e muito suor da minha parte pelo medo de ser atrapalhada, conseguimos chegar a cozinha sem acidentes. 

Levávamos nossos casacos em nossos ombros, então nos vestimos com eles e de lá saímos diretamente para seu carro de mãos dadas. 

— Então.... Eu fui de carro para a faculdade hoje, podemos buscá-lo primeiro? Eu esqueci que estava de carro quando você me ligou pedindo para me buscar. E eu preferia mesmo pegar uma carona com você — confessei. 

Previsivelmente ele riu, mas concordou. Entrei em seu carro pela segunda vez naquele dia, mas com um espírito completamente diferente, como se fosse uma vida depois e não poucas horas. Eu me sentia desfilando sobre as nuvens fofinhas e cheirosas. 

Liguei o som, distraída com sua presença até ele chamar atenção para o que tocava.

— Ah sim, bem propício — Justin sorriu para mim e cantarolou em sua voz aveludada enquanto ligava o carro — Ouço o eco de uma promessa que fiz "Quando você é forte, pode seguir sozinho", mas essas palavras soam distante quando olho em seu rosto — ele me fitou enfatizando — Não, eu não quero seguir sozinho. 

Levei a mão à sua nuca, acariciando sua pele, tão focada no nosso presente feliz quanto no futuro promissor. Apenas nós dois, nenhuma preocupação. 

— Nunca pensei que colocaria meu coração na linha, mas tudo sobre você me diz que desta vez... — ele me convidou a cantar junto com uma rápida olhada e eu o fiz sem titubear — É pra sempre, desta vez eu sei e não há dúvidas em minha mente, pra sempre até que minha vida se acabe. Garota, vou te amar pra sempre — praticamente gritávamos no espaço estreito de seu carro, cada vez mais empolgados.

Seguimos até a faculdade no mesmo embalo, naquele show particular, interrompendo o momento para que eu pudesse pegar meu carro. Suspirei de infelicidade por ter de me afastar um pouquinho e lhe dei um selinho para tomar coragem. 

— Quer apostar corrida? — Perguntou animado.

A neve já tornava o asfalto branco com uma fina camada, interrompida apenas pela marca dos pneus alheios. 

— Vai nessa.

Eu claramente bateria o carro se tentasse aumentar um pouco da velocidade, e queria sobreviver ao menos até o casamento. 

Casamento. 

Tremi ao correr até meu carro. A neve caía a minha volta, mas eu mal notava a temperatura. Meu corpo reagia apenas ao nosso eminente matrimônio. Eu precisaria de um tempo sozinha para refletir calmamente sobre os acontecimentos da noite, o silêncio e vazio em meu carro parecia perfeito para isso, se eu não estivesse tão focada no veículo a frente do meu e encarasse o para-brisa com tanta determinação como se pudesse ver através do seu insulfilm escuro.

Encarei a aliança em meu dedo apertado contra o volante ainda naquele estado de perplexidade maravilhada. Faith Angel Evans Bieber. Parecia muito bonito para mim. Mais do que adequado. Perfeito. Completo. Estava quase conseguindo destravar meus pensamentos coerentes quando chegamos na casa de Pattie. Só então me dei conta de que estava prestes a contar a sua família e isso trouxe mais concretude para o sonho. 

Mal havia desligado o carro quando desci, ao mesmo tempo que meu noivo e lhe dei a mão, ansiosa. Justin, sempre tão calmo e inabalável, exalava a mesma carga elétrica que eu, não havia traço em sua face que não sorrisse. 

— Chamei Ryan e Caitlin para virem também. Dez minutos, eles disseram. Vamos contar ao mesmo tempo? Consegue esconder a aliança até lá? — Ele já estava fazendo menção de tirar a sua. 

Fiz uma careta enquanto o imitava. 

— Se você prometer que essa é a única vez que vamos tirar na vida. 

Seus dentes faiscaram pra mim. 

— Prometo que só tiraremos de livre e espontânea vontade quando for para passar à mão esquerda — ele tomou a dita cuja, beijando meu anelar. 

Derreti-me, mais distraída ainda quando tive clara visão de seus olhos de mel. Eu o agarraria ali de novo, entretanto, parecendo prever a agitação hormonal, ele abriu a porta com um sorrisinho malicioso.

Respirei fundo antes de entrar e me tornar oficialmente noiva a olhos externos. 


terça-feira, 22 de setembro de 2020

One Time 14

Passei a noite no quarto de Jazzy. Vez ou outra ela me pedia para ficar, e naquele dia propositalmente enrolei um pouco conversando com ela, quando tive condições de subir, até que me convidasse a dormir ali. Me recusei a pensar que era por medo de ser uma de nossas últimas noites juntas, eu já estava tão apegada a ela e Jaxon que me doeria muito se tivesse que me separar deles. Contudo, o sentimento de despedida na garganta era quase impossível de engolir. Apertei seu corpinho frágil contra mim como se pudesse obrigar o destino a nos deixar ficar juntas. A família de Justin havia se tornado a minha também, não era só a ele que eu perdia se tudo acabasse no pior dos cenários que se pintavam em minha mente. 

No dia seguinte, levei ela e Jaxon para a escola, acordei mais cedo para deixar tudo meticulosamente arrumado em meu quarto, tomei café da manhã com todos, Pattie ainda estava ali, me lançando breves olhares um pouco preocupados. Procurei evitá-los, ninguém era mais observadora do que Patricia e eu não queria falar sobre aquilo, eu lhe prometera que ficaria, que cuidaria de Justin. Mas não havíamos cogitado a possibilidade dele não me querer mais por perto. Eu também não queria angustiá-la contando que ele estava um pouco perdido dentro de si mesmo. Será que se afastaria da família também? 

Depois que deixei as crianças na escola, ganhando um abraço de cada um que tornou meu humor um pouco melhor, entrei em meu carro para ir a faculdade. A chave já estava na ignição, estava colocando o cinto quando o celular vibrou no contato. Eu li a notificação antes de pegá-lo, uma mensagem de texto:

"Precisamos conversar". 

O clima naquele dia estava mais gelado do que nos anteriores. Os flocos de neve rodopiavam pelo ar como um lembrete congelante de que o pior ainda estava por vir. Naquele momento, eu não conseguia imaginar frio mais terrível do que tomou conta do meu coração. Sem ao menos um "bom dia", "Oi, Faith", ou qualquer cumprimento idiota, Justin me enviara aquelas temíveis palavras. Não se tratava só da reação imediata de um ser humano ao ser chamado para uma conversa sem anúncio prévio do motivo, era toda a junção dos fatos que já estavam em minha cabeça que me paralisara daquele jeito. 

Parecia que eu estava a beira de um precipício, sentindo uma presença opressora nas minhas costas prestes a me empurrar, o medo corria impiedoso por meu sangue, meu estômago se revirava com violência e o coração parecera imediatamente silenciado. Procurei alternativas que me salvassem na minha mente, mas o pânico espantara todas as palavras. 

Peguei o celular, percebendo que eu tremia. Expirei e digitei sem pensar:

"Quando e que horas?"

Se eu estivesse em condições de pensar, veria o quanto parecera duas pessoas marcando uma briga, poderia até rir, mas não tinha graça. Não quando realmente aconteceria uma briga que me nocautearia. Tive esperanças de que ele demorasse a responder. De repente não queria mais conversar com ele, toda a atenção que desejara havia passado. Se ele quisesse podia me ignorar por mais alguns dias, seria melhor do que ter aquela conversa. 

"Depois da sua aula, passo para te buscar. Pode ser?"

Além da minha óbvia covardia, havia algum motivo lógico para negar a oferta, contudo não consegui raciocinar rápido. 

"Ok."

Expirei, esmorecendo no banco do carro. Precisei me lembrar de como respirava, tinha a impressão de que estava sem ar. De repente eu não via mais nada a minha frente, tinha certeza de que não tinha condições de ir para a faculdade, mas não sabia mais aonde ir, o que fazer. Meu cérebro duramente atacado se agarrara na programação do dia, e eu poderia contar apenas com isso vindo dele.

Inspirei e expirei de novo, forçando oxigênio no meu sistema a fim de me acalmar. Talvez minha reação estivesse sendo exagerada. Qualquer que fosse o resultado daquela conversa. Me encolhi. Tudo bem, talvez não tão exagerada assim. Mas eu não podia me deixar abater daquele jeito, tinha deveres a cumprir. Aquele era o último dia de revisão para as provas que começariam impiedosamente no dia seguinte. O mundo continuaria girando, não pararia para me esperar. 

Agindo mecanicamente, girei a chave na ignição e arrastei com garras todo aquele nervosismo e a notícia do que eu faria mais tarde para o canto do meu cérebro. Eu não podia lidar com aquilo naquele momento. Tinha que sobreviver ao dia. Eu sabia bem como sobreviver a um dia. Bloqueei os pensamentos que viriam com essa nova linha. 

Num piscar de olhos eu estava na faculdade, nem atrasada ou adiantada, na hora. Entrei na sala e me dirigi para minha carteira sem ver ninguém, a atenção voltada para a frente, ansiosa para que o professor chegasse. Eu precisava me concentrar em atividades iminentes, não ajudaria em nada ficar parada apenas com a missão de conter meus temores. 

— Faith — Lucas me chamou, encostando de leve em meu ombro — Está tudo bem? — ele pareceu quase assustado ao olhar meus olhos. 

Fiz que sim com a cabeça, imaginando qual seria minha expressão, tentei senti-la, mas para mim parecia apenas neutra. 

— Tem certeza? Aconteceu alguma coisa? — Ele ainda estava preocupado. 

Suspirei, forçando minhas barreiras para não deixar escapar o que eu evitava pensar. 

— Sim, Lucas, tudo tranquilo. E você? — Para mim, minha voz estava ligeiramente distante. 

Ele me avaliou mais um pouco, então resolveu respeitar meu espaço, no sentido figurado, já que logo me empurrou um pouco para o lado a fim de dividir a cadeira comigo. 

— Bem, por enquanto tudo permanece o mesmo. Mandei uma mensagem para Ava ontem a noite pedindo perdão de novo, mas ela não me respondeu. Como você pode ver ela e Ethan ainda não chegaram, mas os amigos dele estão aqui — ele olhou discretamente por cima do ombro — e ainda não me olharam feio. Claro que pode ser apenas um disfarce, eles estão esperando o mandante para me atacar... 

Dei um sorrisinho, o movimento pareceu completamente desconectado do meu corpo. 

— Não seja tão negativo. Vai ficar tudo bem. Qualquer coisa você pode se esconder atrás de mim. 

Cogitei a ideia de apanhar e ir parar no hospital para escapar da conversa que teria mais tarde, e imediatamente me repreendi por isso. 

Lucas enrijeceu ao meu lado de repente, e eu não teria notado se seu corpo não estivesse colado ao meu, lado a lado. Adivinhei qual era sua motivação, e olhei para a porta a tempo de ver Ava e Ethan entrando na sala. Com o braço descansando nos ombros de Ava, nosso colega não parecia irritado. Ava, por outro lado, tinha uma ruguinha discreta de estresse entre as sobrancelhas, e evitou diligentemente olhar em nossa direção, marchando para seu lugar. Ethan deu um selinho rápido nela antes de se direcionar ao seu lugar de sempre, ao fundo, e resignada, ela se sentou na fileira do meio, estrategicamente longe de nós três. 

Lucas só respirou quando Ethan se sentou, e então cochichou para mim. 

— O que você acha? Ele nem nos cumprimentou também, isso quer dizer alguma coisa? Ou só estava distraído? Distraído planejando quebrar meu queixo. 

Se fosse outro dia eu poderia rir da sua histeria, mas apenas empurrei seu ombro com o meu de leve. 

— Acho que ele não sabe de nada, Ethan não é uma pessoa de se conter, se soubesse ele viria direto te quebrar. Ou conversar com você — dei de ombros — Está tudo bem, Lucas. Não acho que ela vá contar a ele, por mais brava que possa estar, ela não ia querer que você ficasse hospitalizado. 

Lucas me lançou um olhar estranho. 

— Hmm... Se você acha. Talvez eu precise ficar perto de você só por precaução durante o dia todo, se importa? 

Estiquei o canto da boca. 

— Nem um pouco. 

Assim que o professor entrou, ele se sentou na carteira ao lado da minha, tive a vaga impressão de que me supervisionava, embora não soubesse a lógica disso. Fiz o máximo que pude para prestar atenção na revisão, tomando notas em meu notbook. Com o tempo percebi que eu estava ansiosa por cada palavra, quase digitando tudo o que saía da boca do professor. Eu queria socar o máximo de matéria possível em meu cérebro, a ponto de não sobrar espaço para pensar em mais nada. E foi o que eu fiz, poderia permanecer horas a fio nas aulas, secretamente desejava que o período pudesse se estender por dias, meses, por todo o restante do ano. Eu não me importaria em perder as festas de fim de ano, aquela podia ser minha festa, de evitar o inevitável. 

Quase gemi quando chegou a hora do intervalo. Almoço. Lucas já estava ao meu lado, quase me atirando fora da cadeira para sairmos primeiro que o casal do ano. Eu o acompanhei sem ânimo. Seguimos para o restaurante do campus em silêncio, eu me concentrava muito nos movimentos necessários para me manter andando, reparando no fundo que o ar estava ainda mais frio. Talvez eu congelasse de dentro para fora. 

— Hm, não está com fome? — Lucas chamou minha atenção quando fui pagar minha comida. 

Eu nem havia percebido o que pegara, hm, uma garrafa de água e um chiclete. 

— Não muito. 

Nos sentamos numa mesa do canto por escolha de Lucas, ele estava o tempo todo atento a nossa volta, esperando um ataque repentino. Não parecia a pessoa ideal para me distrair, já que ele mesmo estava distraído. Mas antes que eu pudesse fazer alguma coisa sobre isso, meu celular despertou para uma chamada. Não houve tempo para temores, o visor já denunciava que era Hanna. Abençoada seja Hanna, ela é uma tagarela nata. Não havia motivos para ser diferente naquele dia. 

Ela estava muito empolgada sobre a última visita que recebera na galeria no dia anterior. Rafael finalmente dera as caras de novo.

— Ele me passou contatos importantes, e conseguiu me encaixar numa exposição de artes super badalada que vai ter em Minneapolis. Vai ser o máximo! Você devia vir... — convidou, já sem esperanças. 

— Eu adoraria. 

 É complicado, eu sei. Bem, então como retribuição eu fiz uma coisa.... — agora ela estava hesitante. 

Fiquei desconfiada de imediato, mais alerta. 

— O que?

— Eu meio que.... hm, eu meio que acabei soltando do jantar de ação de graças aí dessa semana... Eu disse que ele podia vir com a gente... Que eu só confirmaria com você a possibilidade. 

Hanna sabia que eu não conseguiria negar uma coisa dessas assim. Ele sabia que só dependia da minha resposta, ficaria muito feio recusar. Na verdade, eu não me importava muito que ele viesse. O problema era que a casa não era minha e o proprietário já estaria um pouco estressado pela presença de Wren, não que ele gostasse menos de Rafael, mas mesmo assim. E é claro, havia a questão suprema: eu nem sabia se esse jantar permaneceria em pé depois de nos encontrarmos hoje. 

— Hanna... já ouviu falar daquela história que convidado não convida? 

Ela deu uma risadinha culpada.

— Me perdoa. São hábitos ruins, você sempre me deixou muito a vontade aqui em Boston, como se eu fosse de casa, então... 

— O problema é que essa casa não é minha. 

Houve um breve momento de silêncio. 

— Ah, hm, eu deveria ter me lembrado disso. Me desculpa mesmo, eu vou avisar ele que... 

— Não, Han, tudo bem. Depois a gente conversa certinho sobre isso — depois que eu for chutada e cancelar o jantar com todo mundo. Nós ainda poderíamos fazê-lo em Boston. E eu sabia que meu humor estaria quase tão bom quanto na ação de graças do ano retrasado. 

Aliás, quanta ironia. No dia seguinte completaria dois anos que ele decidira morrer para mim. Poderia ser um padrão se repetindo. Dessa vez menos pior. Eu preferia com absoluta certeza que ele permanecesse vivo, ainda que longe de mim. Podia suportar isso. Só não conviveria com sua ausência de existir. Meu mundo só fazia sentido se ele continuasse vivo. A linha de pensamentos acabou arrombando minha caixa tão bem guardada no fundo da mente, soltando meus pesadelos. Se eu não estivesse junto dele, como poderia saber que ainda estava bem? Como teria certeza de que ele mudaria para uma profissão mais saudável, ao menos? Que estaria seguro, longe de inimigos? 

Senti meu rosto perder a cor com as possibilidades, atraindo o olhar assustado de Lucas, que movimentou os lábios quase em silêncio para perguntar se estava tudo bem. Assenti rapidamente e engoli em seco, como se a saliva pudesse empurrar os pensamentos descontrolados novamente na caixinha. Levei alguns segundos para isso, e Hanna teve que repetir a pergunta. 

— Faith? Está tudo bem? Sua voz parece... estranha.

— Sim — menti com firmeza — Me conte sobre essa exposição de artes. 

Pausa.

— Você está me escondendo alguma coisa. Não quer me falar? Precisa de ajuda? — Ela estava a cada segundo mais apreensiva. 

— Hanna, estou em segurança. Está tudo bem. — A primeira parte era verdade, pelo menos. 

Escutei seu suspiro. 

 Podemos conversar sobre isso depois, então? Promete? 

Eu suspirei dessa vez.

— Tudo bem — cedi. Depois de conversar com ele eu precisaria mesmo desabafar. 

— Então esse é um daqueles momentos que você precisa que eu te encha de assuntos triviais? 

Forcei uma risadinha. 

— Sim. 

— Tagarelice a pronta entrega para você então..... — e se desdobrou em seus assuntos intermináveis pelo resto do intervalo inteiro. Havia fofoca fresca no bairro sobre uma nova residente que parecia curiosamente reservada. Estavam tentando decidir se ela estava envolvida com atividades ilícitas ou se apenas era antissocial. Hanna apostava na primeira opção, já que ela parecia nova demais para não curtir a vida, "mais ou menos da nossa idade". 

Recebi descrições minuciosas de todos os boatos e as características da mulher rica e linda que inquietava os vizinhos. Eu me sentia um pouco culpada por deixar Lucas isolado momentaneamente, mas ele não parecia mesmo notar, esquadrilhando os espaços. Talvez ele precisasse tanto quanto eu de uma distração, e eu estava sendo uma péssima amiga naquele momento. Mas não encontrei coragem para desligar o celular e me forçar a conversar com ele, eu não estava em condições de puxar assuntos como ele parecia precisar que eu fizesse, e se ficássemos naquele silêncio doloroso não ajudaria ninguém. 

Então apenas me despedi de minha amiga quando já era hora de voltarmos à sala. 

— Está tudo certo? Você me assustou aquela hora. 

— Ah sim, está sim, eu... Me desculpa por ficar com Hanna o tempo todo do intervalo em ligação. 

 Ele estreitou os olhos para minha resposta vaga a sua pergunta. 

— Não se preocupe por isso — então respirou fundo — Vamos poder estudar hoje? 

— Bem... Acho que não. Qualquer coisa te aviso — tecnicamente, eu não sabia nem onde dormiria naquela noite. Não que achava que Justin fosse capaz de me expulsar da casa de sua mãe, só que não seria melhor partir imediatamente?

E partir para onde? 

Lucas se sentou na minha cadeira comigo e ficou rígido de novo quando Ava e Ethan voltaram do intervalo. Nossa amiga parecia mais inquieta. No fundo eu sabia que deveria falar com ela, não era comigo que estava chateada. Mas Lucas precisava do apoio e... eu não conseguiria me esforçar a ser normal para mais uma pessoa daquele jeito. 

Fiquei grata quando a professora entrou na sala, fazendo uma piadinha sobre sentir nossos nervos com a aproximação das provas finais. Eu ficaria feliz se esse fosse meu único problema. 

Como era o último período do dia, claro que a hora passou muito mais rápido do que eu queria, e eu senti a ansiedade transbordando pelos meus poros, rasgando todas as camadas da minha pele antes de vazar do meu corpo, meu coração mal tinha forças para bater. E quando o professor do último tempo deu a aula por encerrada, não consegui conter o gemido dessa vez. Eu queria protelar, arrumar uma desculpa para ficar na sala, mas Lucas já estava ao meu lado, ele não brincara ao dizer que ficaria ao meu lado o dia todo. 

— Vamos, Faith? — Seu nervosismo era tão evidente que eu não podia ignorar. 

Contra minha vontade, me levantei da cadeira. Ele me ajudou a recolher minhas coisas, pensando estar sendo gentil, enquanto na verdade eu tentava prolongar o máximo a tarefa. Tentei conter a irritação, a culpa não era dele. 

— E então, quais são os seus planos para hoje? — Perguntou com a voz descontraída, mas toda a atenção centrada em mim, como se a conversa fosse muito relevante. 

— Ah... Eu acho que vou ficar com o Justin um pouco — Será que ele podia ouvir a falha na minha voz quando eu falei o nome de Justin?

Talvez sim, a preocupação voltou ao seu rosto, franzindo suas sobrancelhas grossas. Ou talvez ele só se lembrara da pequena desavença no dia anterior. 

— Entendo. Bom, você sabe que se precisar de mim é só chamar, certo? Sério, a qualquer momento — ele agitou seus cachos.

Abri um sorrisinho e dessa vez era genuíno. 

— Claro, obrigada, Lucas. Você também.

Ele piscou pra mim e já estávamos na entrada da faculdade. A temperatura caiu ainda mais. 

— Estou contando com isso — ele beijou o topo da minha cabeça — Tchau, Faith, até amanhã. 

Pela visão periférica eu podia ver Ethan e Ava se aproximando, provavelmente Lucas correria o mais depressa possível para o carro e derraparia para longe da faculdade. Acenei rápido antes que ele se virasse e apressasse o passo para a saída. Respirei fundo e o acompanhei com os olhos, tanto para garantir seu bem estar quanto para procurar a minha ruína. 

Ninguém correu atrás do Lucas, e Ethan não parecia motivado a isso quando passou com Ava devagar perto de mim. Não me virei para olhar pra eles, ainda investigando pelas pessoas e carros ali na frente. Eu me lembrava agora o motivo de um impedimento para Justin vir me buscar, eu estava de carro. Bem, não era como se eu nunca tivesse deixado um veículo em frente a uma faculdade para darmos um passeio. Lembrei-me de quando estávamos nos conhecendo e ele apareceu com aquela moto preta reluzente, tão sedutor e convincente. 

Engoli em seco com a lembrança. Tanto já havia mudado até ali. 

Olhei em volta, percebendo mais uma vez no quanto eu mudara por ele, quanto dispusera da minha vida. Eu já estava no Canadá há dezoito meses. Dezoito meses que acatei mais uma mudança brusca por ele. Por nós.

Não parecia justo para mim. Ele simplesmente jogaria todo esse tempo no lixo como se não fosse nada? Já nos preparávamos para a segunda festa de ação de graças, de natal e ano novo juntos. Eu dei meu sangue para que o clima fosse inteiramente familiar, missão esta complicada porque Bryan meio que o odiava ainda. Mas Eleanor quase já não criticava Patricia. Jazmyn e Jaxon estavam mais apegados a mim do que nunca. Todos nós éramos uma família. Claro que não perfeita, a propósito, existe alguma família perfeita? Sei que ainda tínhamos muito a resolver, e só podíamos fazer aquilo juntos.

O fluxo de pessoas diminuiu até que não restava quase ninguém ali enquanto eu repassava os últimos meses da minha vida na cabeça — meio como se eu estivesse prestes a morrer mesmo. Imaginei se ele ia querer me dar um bolo igual me deu no passado por duas semanas. Talvez fosse mesmo melhor do que a conversa. Eu devia pegar o carro e ir para a sua casa? O suspense estava me matando. Ou podia dirigir diretamente para o restaurante de Patricia e me esconder atrás dela como uma boa covarde.

Chutei a neve acumulada aos meus pés no jardim da faculdade. Minhas meias já estavam úmidas aquela altura e os pés congelados de ficar dando voltas infinitas no espaço descoberto. No momento, essa parte não me importava. Não. Justin não podia estar pensando em terminar comigo agora. Mas o que mais justificaria seu comportamento estranho nas últimas semanas? 

Fui contando nos dedos minhas reflexões. Ele mal falava comigo, mal tinha tempo de me ver, e quando estávamos juntos, parecia distante. Um hora eu o tinha e outra não. Está certo de que minhas aulas serem de período integral não ajudava muito, e diversas vezes ele tinha que trabalhar à noite e viajar, mas nada justificava sua ausência quando estava presente. Provavelmente havia se cansado, finalmente. 

É isso. Se cansou. Perdi a batalha. Estava bom demais para ser verdade mesmo. Desde o começo eu soube que ele não era uma pessoa cômoda com as tradições sociais. Almoços aos domingos com a família reunida, preparar festas de aniversários para crianças, frequentar a igreja às vezes (o mais inacreditável) e estar preso a uma namorada não era do seu feitio. Enganosamente, no início, pensei que ele estava se adequando ao estilo familiar, e até mesmo gostando.

. Ao menos não terminou tudo por uma mensagem no celular, isso lhe dava pontos no caráter. Faria aquilo pessoalmente, como um homem. Não que isso fosse mudar alguma coisa quando as palavras enfim quebrassem meu coração em mil pedacinhos. Fiquei com raiva mais uma vez pela época escolhida para fazer aquilo. Semana de provas e o aniversário de sua suposta morte queria dizer "me dê muita atenção e carinho", não "quebre meu coração mais uma vez". .

O que eu faria? Me mudaria para um apartamento sozinha? Trancaria a faculdade e voltaria para os meus pais com o rabo entre as pernas? Eu não suportaria continuar nessas redondezas sem ele. Se eu voltasse aos Estados Unidos, contudo, sua família paterna ficaria feliz de me receber de braços abertos.

Minha respiração se acelerava cada vez mais, combatendo a iminente falta de ar. Talvez eu fosse desmaiar dali a pouco.

“Cheguei”, li em meu celular.

Farpas afiadas rasgaram minhas tripas. Choraminguei olhando para o céu cinza. O clima combinava com a ocasião. Apesar das minhas roupas, o frio parecia atravessar o tecido e gelar minha alma.

Tudo bem. É melhor enfrentar isso de uma vez, Faith. Esfreguei as mãos cobertas de luvas. Você deve se valorizar, mulher, não é o fim do mundo. Bati as mãos em minhas bochechas. Soltei o ar e caminhei para a saída. O carro estava parado bem em frente ao portão, à minha espera. Levantei a cabeça e entrei.

— Ei — saudou-me com um fantasma de sorriso.

Ah, a quem eu tentava enganar?! Eu não estava pronta para isso! Deus, eu o amo demais. O modo como deixava seu cabelo curto agora, levemente arrepiado na frente de modo natural, o rosto sempre depilado, os olhos notoriamente brilhantes na luz, sua elegância incontestável nos trajes de inverno. Cogitei implorar que não terminasse comigo, mas seria humilhante demais.

— Oi — respondi um pouco estrangulada.

Isso fez com que realmente me olhasse, provavelmente não queria que eu sujasse seu carro com vômito ou morte.

— Está tudo bem?

Preferi não usar a voz dessa vez, assenti. E ele deixou pra lá. Esse era outro péssimo sinal, Justin sabia quando eu mentia, o que quer dizer que não se importou. Ligou o rádio em sua estação de rock preferida, e quase ri de nervoso. Eu sempre soube que o mundo conspirava contra mim, mas já era demais tocar I Don’t Wanna Miss a Thing – Aerosmith num momento desses. “Eu não quero sentir falta de um sorriso, não quero sentir falta de um beijo, eu apenas quero estar com você”. Seu cheiro estava em toda a parte durante todo o trajeto, e como uma viciada eu o respirei em grandes lufadas de ar, temendo ter pouco tempo para senti-lo.

O carro foi estacionado em frente à sua casa. Que gentil, ainda me daria a chance de ver seu refúgio uma última vez, não me levaria a um lugar público para me despachar imediatamente como poderia ter feito. 

— Você pode... subir comigo um pouco?

Eu já estava ali, não estava? O acompanhei casa a dentro ligeiramente aérea, cada passo parecia meu fim, imaginando a forma inusitada que preparara de anunciar o término. Talvez tivesse comprado uma passagem só de ida para os Estados Unidos, por que não?

Paramos em frente a um quarto de hóspedes no segundo andar e eu já estava sem oxigênio no corpo.

— Eu preciso da... sua opinião para uma coisa. Promete pensar com calma? Essa pode ser a última promessa que me faz — ele me olhou com seriedade nos olhos de mel, no fundo, parecia tão perturbado quanto eu. Iludi-me pensando que aquilo seria tão difícil para ele quanto para mim. Se assim fosse, eu poderia demovê-lo do erro.

Retesei-me. "Última promessa?" Sim. Era aquilo. Mas ter meus medos confirmados não me ajudaram em nada. Pisquei para tentar manter meus olhos secos. Passaram-se o que se pareceram minutos até que eu me obrigasse a assentir. Para isso precisei reunir todas as minhas forças, deixando minhas pernas bambas. O calor emanava do seu corpo perto do meu, enganosamente acolhedor. Contudo, ele não me tocara em momento nenhum desde que nos vimos.

Com minha confirmação, Justin abriu a porta e acendeu a luz. O segui cambaleante para dentro, o cômodo estava praticamente vazio, apenas um lençol cobria algum objeto grande no fundo. Justin seguiu exatamente até ele, e pareceu pensar muitas vezes antes de puxá-lo. Eu estava nervosa o bastante para tentar criar hipóteses que justificassem aquilo, só conseguia pensar em todos os motivos para lhe atirar para ficarmos juntos. Nós nascemos para isso. Pertencíamos um ao outro. Ele não podia sentir?

Ou... eu podia sobreviver solteira. Havia nascido solteira, podia morrer sem nunca mais tocar sua pele macia, beijar seus lábios de coração, acariciar seus cabelos quase ondulados e encarar seus olhos de pestanas grandes e escuras. Podia não ouvir mais o som de sua risada infantil e as promessas de que me amava. Podia deixar para trás todos os planos que fizemos para o futuro. 

Sim, eu podia. 

Mas ali, contornando a forma de suas costas largas com meus olhos, tive certeza de que só o faria se já estivesse junto de Deus.

Quis cobrir o rosto quando ele saiu da frente para que eu me aproximasse. Em contrapartida, dei dois passos em direção ao objeto, contra minha vontade — sabendo que eu estava prestes em me atirar em seus braços e chorar —, e automaticamente reconheci um cavalete. Esqueci-me um pouco do meu dilema quando visualizei a pintura que este sustentava, nada melhor para distrair um amante de arte do que a própria arte. Era isso que ele queria? Me amaciar antes do matadouro?

— Hm, de quem é essa pintura? — meu primeiro instinto foi procurar uma assinatura, localizada no canto inferior esquerdo — Você... você quem fez? — surpreendi-me. Claro, ele sempre me surpreendia. Até suas surpresas me fariam falta.

— Sim — a resposta estava carregada, mas não me virei para olhar. Eu não poderia olhar seu rosto a essa altura e me certificar de que não haveria lágrimas escorrendo por minhas bochechas.

Acompanhei os detalhes muito bem feitos da técnica de pintura a óleo sobre tela para identificar o desenho. A cama colossal de lençol azul abrigava um corpo adormecido. Com os cabelos ondulados jogados para trás, era possível visualizar os traços do rosto relaxado.

— Sou... eu? — balbuciei.

— Sim.

Fitei-o impressionada. Perfeccionista como só ele sabia ser, sua pintura parecia um retrato estupendo.

— Justin... desde quando você pinta? Quanto tempo gastou pra fazer isso?

Esse seria o término mais bonito da história. Ele de fato se esforçara para me deixar o mais confortável possível. Se perdera seu tempo precioso aprimorando suas habilidades com um pincel, ainda devia me considerar com carinho. Hanna me contara que várias de suas amigas mantinham uma amizade com os ex namorados, mesmo que ela não entendesse como isso era possível. Talvez eu pudesse me conformar em ser sua amiga.

Toquei na tela receosa de que ainda estivesse molhada. A ponta do meu dedo indicador permanecia seca, então delineei as formas transpostas com tanto cuidado ali, visualizando um Justin sentado em um banco com a postura impecável — como sempre —, concentrado em aplicar um pouco mais de força ali e delicadeza aqui.

Eu nunca poderia ser apenas amiga desse homem.

— Não chega nem perto do quanto pretendo dedicar a você — a intensidade em sua voz aveludada me atingiu como um chicote. 

— Hein? — voltei-me a ele, sobressaltada.

Justin passou a língua sobre os lábios, e agora eu via o quanto ele estava nervoso, a respiração tão pesada quanto a minha. Confirmei o veredicto assim que tomou minhas mãos — já livre de luvas — nas suas, geladas o bastante para que eu me preocupasse em aquecê-las.

— Eu não sou digno de você, Faith. Não sou digno de seus olhares bondosos e cheios de carinho. Não sou digno dos seus beijos tão entregues. Não sou digno dos seus pensamentos mais puros. Não sou digno de te ter em meus braços como minha. Eu sei disso. Tentei pensar em uma forma de te libertar de mim. Tentei me distanciar de você para te fazer entender que a vida oferece muito mais do que um ser quebrado e falho como eu, porque me dói o que significa para você estar comigo. O perigo constante — a voz dele falhou e seus olhos estavam úmidos de repente.

— Mas não consigo mais. Eu não consigo estar sem você. Estou tão perdido, mas você é a minha única certeza. E sou egoísta o bastante para querer que todo o meu tempo seja seu, Faith. Quero estar atado a você de todas as formas possíveis. Quero que nós sejamos um só, de forma que seus traços sejam visíveis em mim, que eu possa refletir seu coração. Quero respirar o seu ar. Quero que seu rosto seja o primeiro e o último que vejo no dia. Quero firmar sob o Céu e a terra que você me tem por inteiro, que eu te pertenço. Eu quero... — a essa altura, eu parecia sentir o bombear frenético do seu coração na ponta dos dedos — te dar meu sobrenome, e te proteger com tudo o que eu tenho e sou. Você tem todo o direito de não querer e fugir de mim sem pensar duas vezes. A escolha é sua. — Com os olhos cravados em mim, Justin se abaixou, entendi então que ele se ajoelhava e perplexa o vi estender uma caixinha de veludo aberta para mim — Por isso, eu te pergunto, Faith: Você aceita se casar comigo?