Leitoras com Swag

Hey garotas, beliebers ou não beliebers. Só estava faltando você aqui! Nesse blog, eu, Isabelle, faço IMAGINE BELIEBERS/ FANFICS. Desde o começo venho avisar que não terá partes hots nas Fics, em nenhuma. Repito, eu faço 'Imagine Belieber' não Imagine belieber Hot. A opinião da autora - Eu, Isabelle - não será mudada. Ficarei grata se vocês conversarem comigo e todas são bem vindas aqui no blog. Deixem o twitter pra eu poder seguir vocês e mais. Aqui a retardatice e a loucura é comum, então não liguem. Entrem e façam a festa.
" O amor não vem de beijos quentes. Nem de amassos apertados. Ele vem das pequenas e carinhosas atitudes."- Deixa Acontecer Naturalmente Facebook.
Lembrem-se disso. Boa leitura :)

Com amor, Isabelle.

segunda-feira, 7 de agosto de 2017

One Love 12

Ryan andava de um lado para o outro, completamente perturbado, ele estava naquele circuito desde a hora em que chegamos em casa; eu já havia tomado banho, comido um lanche natural, e sua maratona não chegara ao fim. Alarmado por uma mensagem de Caitlin sobre minha visita noturna, fora nos encontrar na escola de Krav Maga. Normalmente, seu turno terminava às quatro, então àquela hora ele ainda estaria dormindo. Seus olhos estavam fundos e loucos, me deixando na dúvida de que realmente dormira. Depois da visita de Annelise, não consegui dormir novamente, mas não achei ideal chamá-lo, não podia ter certeza de que ela não voltaria, e não arriscaria que descobrisse Ryan vivo. No fim, eu estava certa em tomar aquela decisão. Ryan era o cara mais despreocupado do mundo, e agora estava praticamente subindo de nervoso pelas paredes.
Coloquei as mãos na cintura com um ruído, exasperada.
— Ryan!
Ele me olhou, despertando do transe. Caitlin batucava os dedos na perna, observando a cena do sofá.
— Você não precisa ficar nervosa, Faith. Vamos cuidar disso — e então seus olhos pararam no meu braço. Eu havia tirado a faixa para tomar banho e ainda não colocara de volta — Ela começou a contagem?! — ele quase gritou, ficando pálido.
Eu nunca o vira assim. Quando estávamos prestes a morrer ano passado, ele ria. Sua reação estava triplicando meu nervosismo. Como se não bastasse ter tanta coisa para me preocupar, Maxon e Yasmin estavam desaparecidos, umas das minhas crianças preferidas no orfanato, embora eu não tivesse feito propositalmente uma classificação. Há dois anos eu visitava o orfanato, e desde o primeiro dia eles estavam lá. Caleb me dissera que sumiram no sábado à noite, e que os Evans estavam dispostos a ajudar como pudessem. Seria possível o mundo me decepcionar mais? Depois de mais esse golpe, formei minha decisão.
— Temos que voltar para Boston.
Ryan negou quase que imediatamente.
— Você não conhece Annelise, ela não vai te perder de vista. Não vai permitir que você vá embora.
— Não vou deixar que ela dite o modo como vivo minha vida. Além do mais, duas das crianças do orfanato que eu visitava estão desaparecidas, eu tenho que ajudar de alguma forma.
A maratona de Ryan recomeçou.
— Você tem que se ajudar primeiro. Se ela te marcou com a contagem, quer dizer que com certeza está com um contrato seu. Quem sabe um proposto pelo próprio George?
Passei as mãos no rosto, como se quando abrisse os olhos de novo tudo estaria acabado. Não achava que fosse possível escapar da morte duas vezes seguidas. Justin contrariara o destino ao me salvar, e essa era a forma do mundo de colocar tudo de volta nos eixos. Eu não deixaria ninguém ir no meu lugar outra vez, mas não podia ir agora.
— Quanto tempo dura a contagem dela? E o que acontece quando acaba?
— O tanto de tempo que ela ganhou para concluir o serviço. A cada encontro que tem com você, é uma marca. E acho que já sabe o que acontece quando o tempo acaba.
Engoli em seco. Viver não tinha mais muito sentido, mas morrer pelas mãos de Annelise não devia ser muito agradável. Eu podia ter uma ideia da criatividade que ela tinha para isso. E aposto que seria mais engenhosa para mim. Ela me odiava.
— Vocês não podem ficar comigo. Se ela achar você, Ryan, acabou. E vai acabar suspeitando de Caitlin. Vocês têm que ficar longe de mim.
Ryan me encarou com irritação por um segundo, depois desistiu e voltou a se concentrar nos seus pensamentos. Eu continuei:
— Eu vou para Boston e vocês ficam aqui, e então dou meu jeito. Vocês não são responsáveis por mim. Ela não suspeita do seu envolvimento.
— Faith, fecha a matraca, eu estou pensando.
Respirei fundo, lhe dando as costas e falando por cima do ombro:
— Tudo bem, pense. Enquanto isso, vou para a galeria. Supere minha ideia, ou depois do expediente, estarei em Boston.
— Você não pode ir simplesmente trabalhar! — ele protestou quando cheguei a porta.
— Preciso do dinheiro para pagar minha passagem — respondi, voando pelo corredor.
Minha carga horária se iniciava às uma da tarde. Eu não estava atrasada, mas não ficaria naquele cubículo de pavor. Ryan precisava de espaço para pensar, pois bem, eu também. E alguma coisa me dizia que Annelise não me procuraria tão cedo. Pelo menos não até completarem-se 24 horas do nosso último encontro. Ela gostava dessa espera de tortura. Só não entendia porque não me marcara desde que nos vimos no restaurante. Não que eu estivesse reclamando.
Ryan também parecia pensar o mesmo que eu, ele não viera atrás de mim, então pude passar a tarde toda com meus pensamentos, os quadros, e clientes. Clientes parcialmente insatisfeitos com meu atendimento meio desleixado naquele dia. Ao ver seus rostos distorcidos em uma careta, pensei seriamente em dar um mínimo escândalo. Eles não podiam reclamar por não me terem inteiramente para si, não quando eu estava ocupada demais arquitetando um plano para fugir de uma assassina, tirar das minhas costas o alvo de uma Companhia de assassinos, resgatar os irmãos do meu falecido namorado, e achar minhas duas crianças favoritas perdidas. Sentia um cansaço incapacitante só de pensar nisso.
Com todo esse histórico, não me esforcei em dar um sorriso para Rafael quando ele entrou na galeria com seu humor radiante. A força que me dera no dia anterior me deixara mesmo em dívida com ele, além do mais, fora comigo deixar Maya na casa dela, e depois me deixara na minha; porém, a culpa não era minha que minha cabeça estivesse explodindo em problemas. Seria muito útil ter uma garrafa de whisky agora, mas se nem sóbria eu estava dando conta, bêbada não sobreviveria a uma hora.
— Pensei mesmo que você ainda estaria aqui — ele se debruçou no balcão, me olhando com o sorriso de covinhas.
Não parei de girar a cadeira em meia lua, apertando minhas têmporas.
— E aonde mais eu estaria? Meu turno acaba às dez — não controlei a hostilidade na voz.
Rafael fingiu não perceber.
— Cumpri o combinado de pedir sua dispensa à Hazel. Nosso encontro está marcado para às 18:00, se lembra?
E mais essa.
Fechei os olhos, expirando.
— Você esqueceu — me acusou, brincando — Tudo bem, não estou com os sentimentos feridos. Só venha comigo e tudo estará perdoado.
— Rafael, eu não...
— Você fez uma promessa. Não me diga que é uma destruidora de promessas, Faith Evans.
Promessas. Justin havia me prometido, olhando nos meus olhos, que tudo daria certo naquele vinte de novembro. O dia mais frio que eu me lembrava de toda a minha vida. Dali três dias fariam seis meses. Eu quase não podia acreditar que conseguira chegar até ali inteira. Tecnicamente.
Rafael tocou minha bochecha, uma faísca de compaixão deixava seu rosto ameno.
— Acho que você precisa mesmo sair. Tudo ainda vai estar do mesmo jeito quando voltar. Não acha que merece se distrair um pouco?
Fui absorvida por seu olho castanho escuro, ponderando. Eu dissera à Ryan que ele tinha até o fim do meu expediente, que normalmente ia até às dez horas. Depois disso, sabia que teria uma avalanche de acontecimentos para serem realizados, e eu provavelmente não conseguiria respirar. Tinha pensado em um plano para resolver tudo com quase um ato só. E para pensar em seu andamento, não precisava necessariamente estar dentro da galeria com clientes chatos e mal-educados. Rafael não merecia sair com um morto vivo ambulante, mas ele era minha válvula de escape.
Ele não permitiu que eu fosse para o apartamento me trocar, temendo que se eu entrasse, mudasse de ideia. Isso provavelmente aconteceria, Caitlin e Ryan não me deixariam sair com Annelise no meu encalço, e eu me deixaria convencer. Ainda não estava certa de que tomara a decisão mais correta, só que eu pisquei e já estava entrando dentro do IDS Center Crystal Court, no centro de Minneapolis.
O shopping fora uma opção quando comprei o presente de Caitlin no domingo, mas encontramos um mais perto. Sua estrutura busca argumentar que a globalização e o meio ambiente ainda podem coexistir; a praça, no centro do shopping, porta diversos bancos de madeira na cor branca, cada quatro ladeando um canteiro de flores portando uma árvore no meio, distribuídos em volta de uma fonte. Várias pessoas se utilizavam do espaço, fosse para mexer no pequeno aparelho celular — agora inerente ao ser humano —, ler algum livro, ou apenas conversar. O piso em um tom de marrom lembrava mesmo a terra. O arquiteto não economizara na criatividade. Acima de nós, o teto se assemelhava a uma escada, construído em alguns degraus de cubo de vidro.
Passamos por baixo da bandeira dos Estados Unidos pendurada no teto e subimos a escada rolante. Rafael me guiou entre as lojas até chegarmos ao fundo e encontrarmos uma porta amadeirada folha dupla, protegida por duas mulheres, vestidas com saias e camisas em um tom de vinho. Com um sorriso, a morena da esquerda pegou os convites que ele as ofereceu, e a porta foi aberta para nós. Em todo o trajeto estive preocupada que seguisse mais uma das ideias estúpidas de Ryan, mas assim que entramos, suspirei de alívio.
— Vladimir Kush! — reconheci, espiando os quadros expostos nas paredes.
— É um memorial dele, achei que você gostaria de vir aqui. Foi a primeira coisa que conversamos, se lembra? Tive essa ideia completamente sozinho — ele discursou, a empolgação beirando sua voz. Pela sua análise em meu rosto, concluía que não havia mandando tão mal dessa vez.
E ele estava certo. Deleitar-me com os quadros de Vladimir sempre me trazia certa paz no espírito que nunca consegui explicar. Isso parecia ser de um milênio atrás, mas eu esperava que seu efeito ainda permanecesse em meu corpo.
— É um sorriso isso o que estou vendo? — ele perguntou, provocativo.
Lhe dei o máximo parecido com um sorriso que eu podia. Ver cérebros gigantes flutuando no oceano se assemelhava ao mais próximo de um último pedido meu antes de morrer. Já o lago em forma de olho, com um peixe servindo de pupila, não precisava estar ali. Basicamente, foi como se Annelise estivesse me encarando, dizendo que estaria onde eu estivesse. Balancei a cabeça, passando para a próxima pintura, me abraçando.
— Essa é você tentando se esconder do mundo — Rafael disse risonho, apontando.
A mulher nua se escondia atrás de um livro proporcional ao seu corpo, colocando as pernas dos dois lados dele, forçando para mantê-lo fechado.
Revirei os olhos com humor, retrucando:
— E esse é uma representação sua e de seu cérebro.
African Sonata apresenta mamutes com cabeça de instrumentos de sopro, não sabia dizer se eram trompetes ou saxofones.
Ele riu, me dando um tapinha no ombro.
— O que acha de se tornar uma dançarina de Flamenco?
Observamos juntos a dançarina de costas na ponta dos pés, uma rosa invertida lhe servia de vestido, as pétalas cobriam a cintura e as pernas, enquanto as folhas verdes serviam de mangas.
A cada tela, uma nova provocação ou um comentário divertido, e Rafael conseguiu ao menos dividir o peso em meus ombros em dois. Assim, consegui organizar todas as minhas ideias. Haviam muitas chances de dar errado. Na verdade, a possibilidade de fazer exigências à Annelise parecia absurda ao analisá-la à luz da lógica. Mas era melhor do que não tentar nada.
— O que achou?
Nós já havíamos olhado todos os quadros e saíamos do memorial levando um folder explicativo sobre as obras.
— Tenho que dizer: você finalmente acertou.
Rafael riu, colocando as mãos no bolso, o andar relaxado.
— Tenho uma ótima intuição. Deveria ter seguido ela desde o começo.
Concordei, reforçando na minha lista de afazeres a surra que daria em Ryan.
— Por exemplo, ela me diz agora que você precisa de comida. Uma pizza?
Coloquei uma mão em seu ombro, demonstrando com a expressão o quanto estava impressionada.
— Você está goleando como o Messi agora.
Rafael me abriu um sorriso largo. Voltamos para o primeiro andar e entramos na fila do Tony’s Pizza Napoletana, enxergando de longe a opção de sabores passada na televisão do estabelecimento vermelho.
— O que vai ser? — ele me perguntou, coçando a barba rala.
Naquele instante, me indaguei por que um cara como ele insistia tanto em sair com alguém como eu. Rafael tinha um rosto muito bonito, traços fortes e bem marcantes só existentes na America Latina; se fosse biologicamente possível, eu diria que seus olhos eram pretos, combinando com os cachos pequenos do cabelo; seus ombros largos e braços fortes davam a sensação de que eu estava segura ao seu lado; sem contar o fato de que sua postura confiante e despojada me deixar quase completamente à vontade. Se Hanna o visse, seria amor a primeira vista. Isso depois de me xingar por não estar colaborando nas aparentes investidas que ele dava. Eu não tinha a autoestima tão alta assim para afirmar que ele tinha interesse em mim, mas só o fato de querer a minha amizade, era estranho.
— O que foi? — disse ele risonho, captando meu olhar quando procurou o motivo de não ter recebido uma resposta minha.
Dei de ombros.
— Só estava me perguntando por que você iria embora do México. Sempre o imaginei como um pais muito divertido e agradável para se viver.
Rafael meneou a cabeça.
— Depende do ponto de vista. Mas vim para cá por causa das oportunidades. Sabe como é, o Estados Unidos é o dono do capitalismo.
— E deixou toda a sua família lá?
— Não, minha mãe, pai, e irmã, vieram comigo — seu sorriso de canto ao falar da família foi perceptível, e ele não precisou de mais incentivo — Minha irmã tem dez anos e ela foi a que mais se empolgou com a mudança. Sonha em encontrar a Katy Perry na rua algum dia desses.
Eu o acompanhei quando riu, criando uma imagem da menina em minha cabeça. Cabelos negros longos e duas covinhas profundas o suficiente para portar todos os seus sonhos.
— Eles estiveram na inauguração semana passada — me disse, esperando que eu tivesse um insight, o qual nunca aconteceria. Estive totalmente aérea naquele evento. Por um momento, pude jurar que Justin estava lá, sentia sua presença no ar, como se fosse possível apalpá-la. No próximo segundo, fui dilacerada de dentro para fora. Maldito homem que se assemelhava a ele de costas.
Acabamos optando pelo sabor Margherita, segundo o vendedor, este foi o responsável por ganhar o campeonato de mundo da pizza em Napole, na Itália. As cores dos ingredientes foram escolhidas exatamente para ilustrar a bandeira da Itália; branco representado pela mozarela de búfala, verde pelo manjericão e vermelho pelo tomate. Escolhemos a mesa redonda mais próxima ao estabelecimento e Rafael prosseguiu com o assunto de sua família.
De alguma forma, ele conseguiu abrir uma brecha nos meus problemas para que eu lhe desse atenção, talvez fosse a maneira que gesticulava com as mãos, enfatizando tudo o que a boca expelia, ou os olhos fixos que me prendiam. Eu não podia ao menos descrever o quanto era prazeroso poder distrair minha cabeça com conversas despreocupadas, nada relacionadas ao meu risco de morte, resgate de crianças, e o vazio em meu peito.
— Você não faz ideia. Mamãe faz um Guacamole que eleva seu paladar à outro nível. Ela competiu no torneio local de receitas tradicionais e levou mil reais para casa.
— Isso sim é um feito. Competir é um lance de família, então — presumi.
— Lupita é a mais fissurada, falou em vencer e ela já está empolgada com a ideia, mesmo sem saber o que será preciso fazer.
Cortei mais um pedaço da pizza e coloquei na boca, tentada à levar aquela preciosidade ao cartório para adicionar Margherita ao meu nome. Todos os outros sabores de pizzas seriam convidados para a festa de casamento.
— Agora me conte sobre a sua família — Rafael pediu, tomando mais um pouco de vinho.
Senti-me imediatamente disposta a ir embora — levando a pizza comigo —, e desviei os olhos para qualquer lugar, de modo que não se interessasse muito pelo assunto.
— O que quer saber? — perguntei com reservas.
— Hm, não sei, eles também estão em Minneapolis?
— Boston.
Rafael não falou nada, uma forma discreta de me motivar a dar mais detalhes. Não mordia a isca, e ele continuou:
— Tem irmão?
— Um.
— E como é seu relacionamento com ele?
— Bom.
Seus talheres descansaram no prato, e senti seus olhos concentrados em mim.
— O que preciso fazer para que confie em mim? Assim poderemos ter uma conversa civilizada.
Não consegui deixar de notar a ironia daquele momento. Há quase um ano atrás, quando eu estava conhecendo Justin, me frustrava com sua ausência de resposta para perguntas simples. Eu abria minha vida pra ele, e suas falas sobre si mesmo eram monossílabas. O sentimento de conforto ao reconhecê-lo em mim não podia ser um bom sinal.
Abri a boca para responder Rafael, mesmo sem ter pensado em alguma coisa genial, e então o vi. Atravessando a praça havia uma loja da Calvin Klein, e ele estava parado em frente a porta. Uma touca vermelha cobria sua cabeça, a blusa de manga longa preta, e a calça da mesma cor, se responsabilizavam pelo restante. Seus olhos impassíveis estavam fixos no meu rosto.
O tempo parou, me comprimindo entre a realidade alternativa e a lógica, descendo o gelo por minhas veias. O garotinho com um balão de hélio em forma de avião entrou em meu campo de visão, batendo os pés e discutindo com a mãe. Não tive tempo de levantar e me esquivar do impedimento, eles já estavam saindo da frente, e ele havia evaporado.
Tive a sensação de que cada um dos meus órgãos caía aos meus pés. Claro que aquela fora mais uma alucinação da minha mente quebrada. Eu só não estava pronta para recebê-la naquele momento, não cometia nenhum ato irresponsável que me deixaria em perigo. Ou estava? Pensar que Rafael podia ser perigoso me faria rir. Delimitei uma alternativa diferente, algo como minha consciência me chamando de volta aos meus dramas cotidianos. O mundo ruía ao meu redor, eu não podia simplesmente vir ao shopping com um amigo.
— Tudo bem, vamos fazer assim — Rafael expirou, tirando a mão de cima da minha, e só aí fui perceber que ele a havia colocado ali — Preciso ir ao banheiro agora, e você usa esse tempo para pensar se quer conversar comigo. Se não se sentir confortável a me dizer nada, eu mesmo preencho todo o silêncio.
Desestruturada com o que ocorrera há pouco, não consegui me pronunciar enquanto ele saía, jazendo na minha cadeira. Parecia ilógico o vazio pulsar, deteriorando mais um pouco do meu corpo já em estado de decomposição. Fechei os olhos, respirando devagar pela boca para ter certeza de que aquela pressão esmagadora em meu peito não me traria um ataque cardíaco. Esvaziei todos os meus pensamentos, me concentrando apenas no vai-e-vem da respiração.
A cadeira na minha frente se arrastou, e cogitei pedir para Rafael me levar embora. Assim que abri os olhos, entretanto, Maya me encarava.
— Oi Maya — cumprimentei-a com um pulinho de sobressalto na cadeira. Sobressalto era apelido, quase levantei e saí correndo.
Restaurei os fragmentos da compostura que eu usava com ela, mas tinha certeza de que meu sorriso não passava de uma distorção facial.
Tão preocupada comigo mesma, fui perceber sua expressão mortal depois de segundos. O alerta vermelho em minha cabeça disparou o instinto de proteção, e antes mesmo de formular teorias para sua frieza, busquei me livrar dela.
— É um prazer te ver, mas já tem uma pessoa sentada comigo — usei a desculpa, camuflando qualquer sinal de nervosismo.
Ela deu um sorriso cínico.
— Com Rafael, certo?
Se o problema se tratava apenas de macho, eu não precisava me preocupar.
Mas meus músculos permaneceram rígidos.
— Sim, como amigos — defendi-me, meticulosamente me retraindo.
— Percebo bem o olhar de amigos que ele te dá, muito diferente do que me direcionava ontem.
Firmei os pés no chão, pressionando para arrastar a cadeira disfarçadamente com o quadril.
— Essas coisas se resolvem com o tempo...
— Você deve entender mesmo dessa coisa de se aproximar de alguém com o tempo. Quanto tempo você leva?
O alerta vermelho se passava para roxo, um neurônio começou a espalhar a ideia. “Não é por causa do Rafael que ela está aqui, não é por causa do Rafael que ela está aqui”.
Continuei a buscar calma, aquilo não se passava de paranoia minha.
— Não entendi — forcei uma risada sem graça passando a mão por baixo da mesa para pegar minha bolsa aos meus pés.
— Conte-me mais uma vez como você se aproximou de mim porque se “identificou comigo” — ela fez aspas com as mãos.
Ok. Não era paranoia. Criei frases evasivas inutilmente. Seus olhos estavam duros, ela não acreditaria em nenhuma palavra que eu dissesse. Eu precisava ficar o mais longe possível dela. AGORA.
Olhei meu pulso, lembrando tarde demais que eu não usava relógio.
— Eu devo estar atrasada, tenho que encontrar alguns amigos agora. Você avisa Rafael para mim? Pode terminar de comer a pizza com ele, tenho certeza de que ficará muito mais feliz com a sua companhia do que com a minha.
Levantei-me devagar, concentrada nos movimentos dela. Estávamos em público, Maya não me atacaria aqui. Atacaria?
— Não vai nem terminar esse pedaço no seu prato? — perguntou petulante.
— Não estou mais com fome. Te ligo depois.
Passei a alça da bolsa no braço, andando a passos rápidos sem uma rota premeditada. Só precisei virar levemente a cabeça para a direita para ver que ela vinha atrás de mim. O ar entalou na minha garganta, eu estava ferrada. Estudei o espaço ao meu redor, tentando identificar mais empregados da Companhia. Deveria saber que essa vantagem não estava ao meu alcance. Não há uma característica física certa que denuncie um assassino, eles se misturam em nosso meio como nossos amigos, irmãos, namorados, familiares, e alguns de nós nunca descobrimos seus segredos mais obscuros.
Xinguei mentalmente ao ver que a saída ficava para o lado contrário de onde eu estava indo, mas se eu tentasse voltar, encontraria Maya no meio do caminho. Abafei o desesperador pensamento de que ela pudesse estar me conduzindo para onde bem queria. Vislumbrei a placa apontando para o estacionamento, e sem pensar duas vezes, corri para o lance de escadas. Uma vez nos degraus pouco movimentados, acelerei os passos, pulando de dois em dois para chegar ao subsolo e poder fugir livremente.
Fui recebida pelo calor do ar concentrado de gasolina, borracha dos pneus no chão e motor. O cheiro denso me deixou claustrofóbica, mas disparei entre os carros, torcendo para algum deles estar saindo e me fornecer uma carona. A percepção dolorosa de que a única pessoa ali travava o carro para entrar no shopping, quase me fez refazer o caminho para o aglomerado de pessoas. O som do sapato de Maya nos degraus me avisou quer a ideia era péssima.
Olhei para todos os lados, choramingando pelo estacionamento ser tão grande. Eu conseguia ver a luz natural do sol entrando pela saída de carros a uns 600 metros para a esquerda, então corri, fazendo o mínimo de barulho que eu podia com os pés, me abaixando para me esconder atrás dos veículos.
— Faith? — Maya cantarolou, o som ecoando — Precisamos conversar.
Eu fazia uma ideia da conversa que ela queria ter a três, nós duas e sua arma de fogo.
— Você sabe que assim está declarando culpa no cartório? Eu nem ao menos te disse coisa alguma.
Não soube distinguir se ela estava correndo, mas não diminui meu ritmo, me detendo apenas quando o bloco de carros terminou para investigar se era seguro ir pela pista para o próximo.
— Você colocou uma corda no meu pescoço, Evans, sabia disso? Fui muito burra para não perceber que me usava desde o começo.
Inclinei-me na lateral do Ford, procurando onde ela estava. Maya calculava cada passo dado a três carros de mim. Ela também devia estar correndo, e eu não podia sair do meu esconderijo.
— Vou propor um trato com você, se me devolver Jazmyn e Jaxon, prometo que você ainda vai poder andar. Aonde você os escondeu, querida?
Aonde eu os escondi? Como os esconderia se não os havia encontrado ainda?
— Você os sequestrou como meio de troca por causa do seu contrato, não foi?
E aí estava, dito em voz alta. A ameaça invisível pairava sobre minha cabeça novamente.
— Não vai funcionar. Devolva os dois e viva o tempo que te resta com todos os membros intactos.
Engatinhei para a traseira do carro quando pude enxergar seus pés, aumentando a distância entre nós novamente. Se ela seguisse reto, eu podia voltar ao shopping e sair pelas portas automáticas.
— Por que está se escondendo? Não é de mim que precisa ter medo. Annelise tem um grande trabalho pela frente.  
Ela parou no meio da pista, colocando as mãos na cintura. De fato, não possuía uma arma em mãos, mas isso não foi capaz de acalmar meus batimentos cardíacos. Recuei para ficar atrás do carro, sem prestar atenção que minha bolsa ficara presa na placa. O efeito elástico me puxou de volta para a frente e eu cai de joelhos no chão.
Annelise se virou no mesmo instante e seu rosto enfurecido não tinha nenhuma relação com a voz anteriormente agradável.
— Aí está você.

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